quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

Mestre Eckhart interpreta os símbolos de Maria e Marta. Leitura da 1ª parte do sermão, levemente comentada.

Mestre Eckhart (1260-1320) foi um religioso dominicano que chegou a professor da Sorbonne, de Paris, por duas vezes, e que foi pároco e vigário em vários conventos da Alemanha,  com forte capacidade de elevação mística e que pregou muitas vezes, transmitindo as suas experiências e compreensões do espírito e de Deus, e do caminho espiritual, sempre a a partir de comentários dos evangelhos. Mesmo assim acabou por ser denunciado pelo arcebispo invejoso de Colónia, já quando tinha grande fama e mais de 60 anos, obrigando-o a defender-se junto ao Papa, então em Avignon, e foi considerado herético em algumas das suas proposições mais ousadas, ao procurar atingir a unidade divina, o Absoluto, a não Dualidade, o Pai, e não valorizando tanto a mediação de Jesus, ou dos sacerdotes, ou sequer os conceitos de bem e de mal...

Foi já a  27 de março de 1329 que o Papa João XXII, após consultas demoradas, e as respostas defensivas  de Eckart, que entretanto já morrera, que foram consideradas como heréticas dezassete proposições retiradas das obras de Mestre Eckhart e repudiou onze outras como “completamente ressoando mal, muito temerárias e suspeitas de heresia”.

Como praticante de longas e profundas meditações Eckhart conseguiu ter boas intuições dos níveis mais elevados do ser e de Deus, do fundo divino que está no fundo da alma humana e como mestre de teologia e metafisica especulou com coragem e originalidade,  realçando a necessidade de nos despreendermos do criado, e abandonarmos o ego, para podermos ser abençoados pela graça divina. A sua linha de força era a Deificação do homem mas que apresentou de um modo demasiado forte, e  uma das proposições condenadas mostra-o: «O que quer que seja que a Sagrada Escritura diga de Cristo, tudo isso é também verdade para todo o homem bom e divino.» Como pregava não só para religiosos e religiosas dos conventos, como também para os grupos do movimento do Livre Espírito, então florescente, tais as beguinas, e ainda os paroquianos comuns, sabia dar conselhos práticos para se avançar no caminho espiritual, ou seja avisos e percepções dos modos de estarmos mais próximos ou abertos à graça da Divindade

É caso do sermão sobre o passo evangélico da visita de Jesus a Maria e Marta, geralmente consideradas símbolos da vida activa e da contemplativa e interpretado com originalidade  por mestre Eckhart, considerando que Maria era a mais nova e inexperiente e por isso estava tão ansiosa de sentir a bem-aventurança, o gozo espiritual de estar com o mestre, ou próximo de alguém unido a Deus, não querendo envolver-se em actos exteriores, enquanto Marta era mais velha e sabia agir mantendo a ligação com a Divindade.

Este sermão, Jesus intravit in quoddam castellum et mulier quaedam, Martha nomine, excepit illum in domum suam, comentando o passo do evangelho de S. Lucas X, 38, foi traduzido por Maurice Gandilac e publicado na excelente revista Commerce, no caderno 3, do 1º semestre de 1964, em Paris. No dia de 25 Dezembro, de manhã cedo, resolvemos com um cartão forte abrir as folhas, e ler pela 1ª vez o sermão,  e gravar a tradução em simultâneo. Eis a 1ª parte, com alguns breves comentários. Contamos apresentar a 2ª parte brevemente e é natural que acrescente neste artigo mais um ou outro ensinamento valioso de Eckhart nos próximos dias.... Lux Dei!

                        

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