quinta-feira, 29 de junho de 2017

Julho e as efemérides e as grandes almas do encontro do Ocidente e do Oriente, de Portugal e da Índia.

1-VII. É D. Juliana Dias da Costa, nascida em Agra, filha de Agostinho Costa, um dos prisioneiros de Hugli, que veio a ser o médico do príncipe Bahadur, tornou-se a médica e educadora dos filhos e filhas do imperador mogol Aurangzeb, entre os quais Bahadur Shah, a quem sempre foi fiel. Quando este subiu ao trono (em 1707), recebeu recompensas e o privilégio de coroar imperadores, sendo presenteada ainda com a casa que fora do príncipe Dara Shikoh, o sábio irmão mais velho de Aurangzeb e por este morto na luta pela sucessão. Foi a grande protectora dos cristãos e ocidentais, até morrer neste dia em 1734. O P. Desideri, autor da Relação sobre o Tibete, chama-a "suporte e ornamento da nossa santa Fé no Império". O imperador Bahadur Shah, que a consultava constantemente, dizia que se ela fosse homem escolhia-a para vizir e chamava-lhe Mãe e Fidavi Duago, Dedicada à Oração. Na corte do mogóis, como na de outros reinos da Índia, houve frequentemente portugueses e europeus, contribuindo com os seus dotes numa universalidade civilizacional também significativa da hospitalidade indiana. O raja Jai Singh Sawai, de Jaipur, o criador dos observatórios astronómicos famosos de Delhi e Jaipur, acolhera na sua corte o Padre Figueiredo e o médico Pedro da Silva, tendo recebido do primeiro importantes livros astronómicos. D. Juliana Dias da Costa, nos seus últimos anos de vida, pediu que a deixassem recolher-se ao convento das Mónicas em Velha Goa, mas nem a corte mogol, nem o vice-rei e os padres portugueses autorizaram, mostrando-lhe quão valioso era o mérito do seu serviço, reconhecido mesmo pela companhia Holandesa das Índias Orientais.
O Rei D. João V morre neste dia 31 em 1750. A relação oficial do mesmo ano a Vida, sucessos e falessimento do Rey Fidelissimo D. João V, escrita pouco após a sua morte, descreve bastante arrogante e militarmente o seu reinado na Índia: «No Estado da Índia infundio o seu império naqueles bárbaros profundos respeitos, destruindo as suas armas os Reis de Canara e Sunda, vencidos numa batalha naval. No ano de 1717 reduziu a cinzas a cidade de Porpatane o general D. Lopo de Almeida. No de 1719 alcançou uma completa vitória dos Arabios o Almirante António de Figueiredo Utra. No de 1726 sujeitou o Vice Rei João de DSaldanha ao orgulhoso Régulo Sar-Dessai de Cudale, obrigando-o a pedir a paz, depois de abrazar-lhe as aldeias de Peligão, e de Maien; adiantando este mesmo vice-rei estas vitórias, ganhando Bicholin depois de seis dias de sítio./ Constando-lhe que com furiosa guerra invadia o Marata a todo o Norte, até encher de sustos a Goa, levado do zelo da Religião, que se via profanada naquela Cristandade, mandou por Vice-Rei daquele Estado ao Conde da Ericeira D. Luiz de Menezes com uma numerosa esquadra: o mesmo importante socorro acompnahou a Pedro de Mascarenhas, que lhe sucedeu no Governo; até que ultimamente governando aquele Estado o Marquês de Castelo-Novo, alcançou dos Bonsulós tantas vitórias, como constão de vários manifestos, rendendo todas aquelas praças, que nos governos passados desde a aclamação del-Rei Dom João IV tinhamos perdido naquele Estado; fazendo gloriosa a sua memória, e não menos imortal o seu nome nos Portugueses Fastos; remetendo-lhe El Rey importantissimos socorros para seguir os seus triunfos, e dando-lhe em prémio dos seus distintos merecimentos o título de Marquês de Alorna, uma das praças conquistadas pelo seu valor, que tem posto em reverente consternação todo aquele vastíssimo continente». Assim terminava, muito exagerando nos efeitos no vastíssimo subcontinente...
redescoberta a ilha da Madeira em 1420, devido às diligências do infante D. Henrique, pelo cavaleiro da sua Casa, João Gonçalves Zarco,  por entre as brumas surgindo uma terra tão frondosa e arborizada, que  o nome de Madeira pareceu o mais justo e auspicioso. Seguir-se-ão as navegações de Gonçalo Velho Cabral, Gil Eanes, Gonçalves Baldaia, Antão Gonçalves, Nuno Tristão, quase todos cavaleiros da Ordem de Cristo, desbravando as nuvens e fantasmas da costa da África, e a ilha crescerá até ser conhecida como a pérola do Oceano Atlântico.
   
Nasce em Tondela, em 1831, Tomás Ribeiro. Formar-se-é em Coimbra em Direito e destacar-se-á como poeta, escritor, advogado, deputado, ministro e diplomata. Fez parte da geração romântica e ultra-romântica, colaborou em inúmeras revistas e o seu longo e pesado poema D. Jaime ou a dominação de Castela, 1862, demasiado elogiado por Castilho, foi um dos rastilhos para a Questão Coimbrã, sendo algo zurzido por Antero de Quental. A lição foi aprendida, pois quando se deu em 1864 a Rolinada, a revolta dos estudantes conimbricenses liderada por Antero de Quental contra a portaria do governo de Rolim de Moura Barreto, e 1º Duque de Loulé, Tomás Ribeiro foi o único deputado a apoiar os estudantes. Ao não ser eleito posteriormente como deputado por Tondela, partiu em 1871 como secretário de Januário Correia de Almeida, 1º visconde de S. Januário, novo Governador Geral da Índia (o 95º, de 1870 a 1875),   fundando em Goa em 1871 o Instituto Vasco da Gama que terá um papel importante na cultura indo-portuguesa, já que promovia a cultura, organizava conferências e editava um Boletim no qual colaboraram grandes almas. As obras de Tomás Ribeiro que mais reflectem ou versam a sua ligação com a Índia são a Indiana, entre-acto em verso, 1873,  com breves notas finais valiosas, nomeadamente quanto aos yogis, tulsi (o manjericão sagrado dos brâmanes) e a opressão das viúvas, muito bem dedicada ao ministro do reino António Rodrigues Sampaio, por ser homem de letras e «acima de tudo há ainda uma grande e ininterrompida amizade e dívidas de gratidão que nunca poderei pagar e de que nunca desejarei ser quite», as Vésperas, 1880, e a valiosa descrição da sua viagem, As Jornadas, dada à luz em dois volumes em 1873.
                                     
Wenceslau de Morais, o notável amante do Japão e escritor de uma infinita capacidade de observação amorosa dos seres e coisas: «Nesta terra de deuses e de buddhas, em Tokushima, onde eu vim estabelecer o meu albergue, onde vim em procura da paz, da tranquilidade, para o corpo e para o espírito... com a esperança inconfessada, mas profundamente sentida, de entrar aqui em íntimas relações com eles, com os meus mortos», liberta-se neste dia 1 de Julho em 1929 do corpo físico, que é cremado conforme o seu desejo. No seu belíssimo livro Bon-Odori em Tokushima (Festival dos Mortos na cidade de Tokushima), interroga-se: «Não haverá nos espaços da nossa atmosfera encontros e embates entre as hertzianas e muitas outras ondulações de forças ainda hoje apenas imaginadas ou absolutamente ignoradas?... E não constituirão os espíritos dos mortos uma dessas estupendas forças de mistério? Ao povo japonês, pelo menos, não repugnaria a hipótese, ele que admite a descida periódica à terra durante o Bon, a festa dos mortos, dos seus queridos desaparecidos». O embaixador no Japão Armando Martins Janeira conta-nos, em 1980, que «todos os anos, ao voltar a Tokushima, a minha primeira visita era sempre para Moraes. Ainda não posso vencer o espanto de encontrar em tão longínqua paisagem e em tão estranha atmosfera a confortante companhia espiritual dum homem do meu país, que sinto hoje como um amigo. E este espanto era combinado com um sentimento de felicidade, quando via em cada festival, todas as noites, rapazes e raparigas, finda a festa oficial, já tarde, prolongar as suas folias dançando e cantando diante do seu monumento. Parecia-me que Wenceslau sorria, feliz e recompensado do seu amor pelo Japão.» Também eu consegui peregrinar em 2011 a Tokushima, na noite do Bon Odori, e admirar, andar, dialogar e dançar por um lado e por outro ir orar, meditar e comungar no túmulo dele. Hoje está mais esquecido, tanto no Japão como em Portugal, embora se erga lá um museu, e a sua obra ainda tenha ainda tanta sabedoria para ser investigada e partilhada...
                                                   
2-VII. É lançada a primeira pedra do Convento de Santa Mónica, de freiras Agostinhas, em Goa, pelo arcebispo de Goa e Primaz do Oriente D. Aleixo de Meneses, neste dia, em 1606. Lar, casa de educação e seminário, aqui se cultivarão as artes indo-portuguesas com muito amor, dos bordados, colchas e paramentos, aos doces e conservas, rosários e bentinhos, que as madres e sorores, noviças e senhoras cujos maridos servissem longe, executavam na grande casa de lavor com vista perfumada para os jardins quentes e húmidos do convento, depois das refeições, quando a alma menos facilmente se elevava em devoção religiosa a Deus. Havia uma freira pedagoga «mui destra na música» que ensinava «exercícios de cantoria» às jovens, e as monjas tocavam em público, mostrando grande habilidade. Algumas madres chegaram também à fama de santidade, tal a Sóror Maria de Jesus, cujo retrato no leito da morte se encontra ainda hoje no convento. A excessiva riqueza patrimonial e o grande número de freiras suscitarão algumas reclamações de contenção por parte dos vice-reis e do senado de Goa que serão atendidas pelo poder central em Lisboa. Frei Agostinho de Santa Maria deixou-nos a História do Real Convento de Santa Mónica, em que as vidas discretas de tantas jovens e senhoras perpassam na subtileza das memórias na eternidade da grande alma indo-portuguesa. No mesmo dia foi também inaugurada a Casa de Recolhimento de Nossa Senhora da Serra, para onde foram transferidas as raparigas órfães, ou viúvas
de militares, que estavam desde 1598 junto à igreja de N. Senhora da Serra. Havia muitas, e já a cartas reais em 1563 e 1573 instavam pela construção dum recolhimento que as protegesse e permitisse casarem-se bem. Pregou o Arcebispo e frade agostinho Aleixo de Meneses, familiar de Afonso de Albuquerque, e na presença do Vice-rei D. Martim Afonso de Castro, vindo a caber à Misericórdia de Goa a gestão de tão moral fundação.
                           
Nasce em Calw, no sul da Alemanha em 1877, Herman Hesse, filho de pais missionários protestantes que estiveram até na Índia. Não querendo seguir a carreira deles, formou-se por si próprio e aos 21 anos publicou o seu primeiro livro de poesia, mas será com Peter Camenzind, em 1903, que obterá grande sucesso tornando-se autor de belos textos de poesia, prosa e ficção inspirados na busca da sabedoria e da harmonia. Em 1911 peregrinou à Índia, e de tal encontro nasceram ou aperfeiçoaram-se obras como Siddhartha, a Jornada rumo ao Oriente, O Jogo das pedras de vidro. Em Siddhartha, uma das melhores descrições romanceadas por um ocidental do caminhar espiritual na Índia, confia-nos um método de concentração tradicional yoguico, o da repetição (japa) do mantra Aum: «Om é o arco, a seta é a alma, Brahman (a Divindade ou o Epírito eterno) é o alvo da seta, ao qual se aponta firmemente». Foi prémio Nobel da Literatura em 1946 pela sua obra poética e de romancista, e viveu até aos 85 anos, correspondendo-se muito com os seus leitores e deixando uma obra pioneira na aproximação muito sensível ou mesmo de amor à natureza e à humanidade na sua dimensão da espiritualidade perene.
                             
                Herman Hesse, em 1920. Eu sou o que contemplo....
3-VII. D. Manuel I dá o Regimento da Casa da Índia em 1509: «Como somos obrigados trabalhar, quanto em nós for, de as tais coisas serem bem regidas e governadas e conservadas». Já no regimento que D. Manuel I dera a Simão de Oliveira, o qual mandou ao rei do Congo, a dualidade das causas principais da expansão e conquista portuguesa, «proveito de fazenda e acrescentamento de fé», surge desmistificada pois, ordenando a Simão de Oliveira que exija do rei de Congo escravos e bens, recomenda-lhe com certa hipocrisia por duas vezes que «tudo isso lhe lhe direis como de vosso, sem lhe dizerdes coisa alguma da nossa parte», pois nas aparências convinha manter a imagem dum rei piedoso, exactamente o que seu sucessor conseguirá receber de cognome, embora prosseguindo a mesma política expansionista sob o cobrimento de uma religiosidade que se foi tornando cada vez menos tolerante e portanto incapaz de ser universalista pelo amor, ou pelo menos, por respeito, tolerância e não-violência, e geradora de ecumenismo...
Francisco de Sousa Tavares, após muito anos na Índia, na qual gastou
grande soma de cabedais, ao servir como capitão de Calecut (1527) Cananor 1527 e da fortaleza de Dius (1540) faz neste dia em Almada, em 1562, o seu testamento, no qual lembra aos seus filhos os direitos que ele têm em relação a esses dispêndios energéticos abnegadamente doados à pátria lusa no Oriente. Contudo onde mais se distinguiu foi na busca e realização espiritual, deixando-nos um Livro da Doctrina Espiritual, impresso em Lisboa por João Barreira, em 1563. É das obras de maior profundidade espiritual da nossa tratadística mística e é possível que tivesse recebido alguns influxos do Oriente, tanto mais que algum quietismo e controle e suspensão-anulação do ego perpassam pela sua obra, a qual teve problemas com determinados sectores religiosos. Com efeito, numa época em que o misticismo era algo atacado, Francisco Sousa Tavares, qual Cavaleiro ou Fiel do Amor que era, fala numa linguagem bem próxima da modernidade, tendo como tenção no prefácio da sua obra «mostrar que o que as pessoas espirituais dizem, de ajuntar e unir a alma com Deus, arremedar do nosso modo aos do céu, ser espiritual e adorar a Deus em espírito, paz interior, divina união, contemplação divina, e outros nomes e efeitos que este acto da mente em Deus tem, fazendo com a perseverança que Cristo e toda a Sagrada Escritura ensina, dá a Deus o já dito, e outras muitas graças». De realçar a expressão «a toda a Sagrada Escritura» que poderá abarcar as Escrituras sagradas de outras religiões, e as «muitas graças», as nomeadas e outras menos canónicas ou conhecidas, que o acto da mente em Deus pode proporcionar-nos.Valorizará muito a oração do Pai Nosso, considerando que: «desejar o reino de Deus, é o próprio Deus», bem como a utilização de certas imagens, tal como «imaginar que está sempre justamente em meio de um pego de amor infinito» e certas jaculatórias ou mantras, tais como: «Deus entende-me minha ajuda, apresta-te a me ajudar», ou o clássico, «seja feita a Tua vontade», ou ainda o mais revolucionário «que em tudo está Deus e tudo é Deus», mostrando um panteísmo ou panpsiquismo que no século XXI alguns investigadores mais avançados defendem.
O jesuíta goês Belchior Figueiredo morre em 1607,
depois de 40 anos de missionário no Japão e na China com sucessos notáveis, como a conversão de um mestre médico e suas centenas de discípulos. Deixou valiosas Cartas, publicadas em Évora em 1589, descrevendo numa delas como no meio da igreja de Bungo, na noite de Natal, os missionários da Companhia de Jesus organizavam cenas das Escrituras com muitos figurantes, para admiração e edificação dos japoneses.
                                    
                            O mandir ou pequeno templo dedicado a Gurudev Ranade
Nasce neste dia 3 de Julho,  em 1886,  em Jamkhandi, na Índia, Gurudeva Ranade,  um dos mais brilhantes filósofos indianos do século XX, no verdadeiro sentido da palavra, juntando ao trabalho intelectual, um modo de vida, e a prática e a experiência espiritual. Foi professor de Filosofia e chegou a vice-Chanceler na Universidade de Allahabad. Disse: «A minha filosofia não é diferente da minha vida... As dores e as misérias ajudarão a purgar a mente das suas impurezas... Uma vez gerada a devoção, a qualidade torna-se mais importante que a quantidade... A miséria pode ser suportada; os ataques de tentação, o ódio, podem ser tolerados; mas a dor física torna-se insuportável a partir de certo limite. Em tais ocasiões a única via que permanece é orar a Deus para nos permitir meditar... Os critérios de perfeição na vida espiritual são: a consciência de estar sem pecar, de ser um com Deus, e saber que nenhuma pessoa senão Deus é o verdadeiro agente no mundo.»
 Todavia, considerava indispensável o mestre: «A forma de Deus deve descer sobre nós, para o que deve haver um professor de elevado nível espiritual. Só então ele pode descer para o nível inferior do discípulo. Se o mestre nada tem, o discípulo nada recebe. Por vezes pode acontecer o discípulo receber algo, mesmo que o professor nada tenha. Mas há um limite para isso, e então o discípulo deixa de fazer progressos». Para Ranade, o Brahmane [membro da casta religiosa] é quem realizou Brahman, a Divindade, ou seja, aquele que conseguiu estabelecer uma comunicação fácil com Deus e que nada é mais querido ou amado que a forma com que Deus se lhe manifesta». O presidente da Índia, Radhakrishnan, em 1954 escreveu:«Com Ranade, a Filosofia é a demanda da sabedoria e não um mero exercício intelectual. É para ele uma meditação no Espírito, um modo de vida dedicado».  
A sua sadhana assentava sobretudo na devoção ou sentimento amoroso (bhava) para com Deus e depois na meditação no nome de Deus e na  sua forma. E nessa prática desenvolveu notável sensibilidade, fazendo a dança da mente cessar e discernindo particularidades da fisiologia espiritual, tal como a necessidade de abrir a janela existente no ventrículo do coração, algo que já o santo Kabir cantara. Ou que o pôr em movimento simultaneamente os oito chakras era um bom sinal de avanço no caminho para Deus. Numa das suas cartas quando estava doente diz ao seu guru: «Estou a tentar praticar a sadhana o mais possível. Muito raramente a tenho a visão suprasensorial da lua crescente azul. Se recuperar a saúde eu praticarei a repetição do nome de Deus pelo menos uma hora duas vezes por dia.»
                                            
4-VII. A rainha Santa Isabel deixa este vale de lágrimas e de rosas, em 1336, neste dia, abatida pela peste, em Estremoz. E como Clarissa do mosteiro de Santa Clara a Velha, em Coimbra, pedira para o seu corpo ser levado para o convento, o que se fez apesar do pino do calor numa jornada cheia de devoção e até do começo dos seus milagres. Tivera uma vida de 65 anos dedicada à harmonia política e social, à acção desinteressada e à oração. Aragonesa pelo pai e siciliana pela mãe, casando-se aos doze anos com D. Dinis, teve ao seu lado os espirituais franciscanos, recebeu o magistério de Arnaldo Villanova e de algum modo indirecto o de Joaquim de Fiore, peregrinou duas vezes a Santiago de Compostela e protegeu o incipiente culto bemfazejo do Espírito Santo, instituindo as festas em Alenquer, ainda hoje vivas. Este culto do misterioso Espírito santo, invocado no "Veni, Sancte Spiritus, vem encher os corações dos teus fiéis e acender neles a chama do teu amor", e que desde então se tornou um estímulo ao aprofundamento dos mistérios divinos e uma característica especial da religiosidade portuguesa. Se bem que festejado em alguns locais com intensidade fraterna e inventiva, nomeadamente nos Açores, não deu ainda todos os frutos, nomeadamente os mais espirituais e contemplativos. Ao longo dos séculos a rainha Santa Isabel manterá uma estreita relação com a grande alma portuguesa, sendo no invisível uma mestra da sua Ordem espiritual, e ainda hoje o seu corpo, no belo mosteiro de Santa Clara a Nova em Coimbra, é um pólo orientador e intensificador da invocação devota e da fé transformadora, neste dia celebrado com mais pompa e dignidade, nomeadamente numa procissão periódica que atrai muitos peregrinos e fiéis do Amor Divino e da sua rainha santa...
                                              
Nasce em Linhares, em 1542, Gregório Lopes, que virá a ser no México eremita da linha mais pura e directa, por exemplo, não usando imagens na cela nem rezando o terço. Pedindo-lhe um dia um frade uma regra para saber orar e fazer oração, entregou-lhe uma ainda hoje utilizável por nós: «Senhor, meu Deus, dá luz à minha alma para te conhecer e amar com todo o coração». Da sua relação com Deus, segredava: «desta união, como de fonte e origem havia tirado e tirava sempre o que sabia, porque Deus era o seu Mestre e não os livros, posto que de grande consolação lhe servia e de grande satisfação à sua alma ver e ler em Tauler e Ruysbroeck [dois dos mais lidos místicos medievais] escritas as coisas nuas e claras, interiores, que Deus comunicava em seu espírito».
O P. João Cabral, depois duma vida aventurosa, morre em Goa em 1669. Duas viagens pelo lado de Bengala até ao Tibete, chegando a Shigatsé. Regressa a Cochim. Mais tarde reitor do Colégio de S. Paulo em Macau. No Tibete ouviram falar muito do reino de Shambhala e tanto ele como o seu companheiro Estêvão Cacela interrogavam-se se seria a China. Só mais tarde é que terá a certeza e escreverá: «Xembala não é o Cataio (China)». Mas ainda hoje Shambhala, Shangri Lhá, Himavat, é domínio não profanado...
Nascem os Estados Unidos da América do Norte, quando 13 colónias inglesas se declaram independentes e livres em 1776. No hemisfério sul será mais tardio o cortar dos cordões umbilicais com os países colonizadores ou formadores. Será neste país que o público ocidental em geral e a juventude se abrirão mais aos gurus indianos, a partir dos meados do século XX, embora já o 1º Parlamento Mundial das Religiões em 1897 tivesse feito convergir representantes das várias religiões e tradições espirituais para Chicago. Swami Vivekananda será um dos que mais brilhou lá, iniciando depois uma permanência na USA frutuosa para a divulgação do Advaita Vedanta e da mística de Sri Ramakrishna, seu mestre. A má ou destrutiva e inepta política imperialista da USA, desde a década dos anos 60 e acentuada desde os anos 90 no Médio Oriente destruiu muitas das ligações do Oriente e Ocidente (a principal sendo o caminho por terra entre a Europa e a Índia), gerou o terrorismo, e matou milhões de seres, fazendo  tal país tornar-se uma desgraça, uma praga mundial, afectando mesmo os seus cidadãos onde quer que estejam, por muita arrogância e vaidade que ainda tenham, mas a ganância e a maldade dos grupos de pressão financeiros e militares dirigentes dos Estados Unidos da América é de facto diabólica. Veja-se o que estão a fazer ao povo ucraniano, usando-o mortiferamente na sua luta pela hegemonia mundial e contra a Rússia.
António Aleixo de Santana Rodrigues nasce em Vernã, Salsete, Índia, neste dia 4-VII-1887 e viverá 79 anos de grande actividade como médico, professor e escritor, tendo entrado ainda como oficial miliciano na 1ª grande Guerra. Participou no XVII Congresso Internacional dos Orientalistas, em Oxford, 1928. Embora formado na Escola Médica de Goa, defendeu também um nova dissertação em Lisboa, com o palpitante título Estudos de Pscologia. A Dynamica do Pensamento, impresso em 1919. No seu livro, dado à luz em Lisboa (onde ele passou a residir desde 1910) em 1926, antes ainda da instauração do Estado Novo (o qual foi mais opressivo do nacionalismo indiano), dá uma visão geral da evolução histórica, cultural e religiosa da Índia, com capítulos mais desenvolvidos sobre a reacção à dominação inglesa («uma sacrílega e ambiciosa tavolagem havia arrojado os destinos do país às mãos dos ingleses (...) A Companhia das Índias, arrogante pela vitória e confiada na suas penetrantes insídias, na leviandade e no desânimo covarde dos adversários, assolara as cidades...» e sobre as grandes almas indianas, nomeadamente, entre muitas outras que demonstram a sua boa informação, Gandhi, Tagore, Chandra Bose, Lal Shamkar. Apoia e elogia francamente o movimento de auto-governação, não cooperação e resistência não-violenta gandhiano. Um dos seus últimos artigos versou sobre Misticismo e Medicina, no vol. 16 da Imprensa Médica, 1952.
                                     
                Fotografia desfocada do retrato presumível de D. António José de Noronha.
5-VII. «Nove meses e dois dias retido no ventre da minha mãe, dele saí pela permissão do Altíssimo quase leso de sentidos, de modo que me tinham por morto, o que causou grande choro aos meus pais por espaço de duas horas. Foi porém servido o mesmo Senhor dos alentos da vida de sorte que abrisse os olhos no teatro deste mundo em cindo de Julho de 1720.» Assim escrevia no seu diário (inédito até 1995, quando Carmen M. Radulet, o deu muito bem contextualizado à luz) D. António José de Noronha, coronel e bispo de Halicarnasse, um dos nossos Cavaleiros Fiéis do Amor, ao entrar na barra de Goa em 25-I-1774, continuando com a descrição da sua viagem e situação veterana e por fim bem provada: «Nove meses também existentes no ventre desta fragata-mãe, a nau Mariana Vitória, causando sofrimentos e choro aos meus parentes que me julgavam sem honra e reputação. Se naquele me achei ressuscitado, hoje, neste, já velho e veterano, com sofrimento de calúnias excessivas. Esta segunda mãe foi pára de substância venérea de uma grande vitória de maneira que, levando-me para o Reino de Portugal em infusão de umas falsas arguições, trouxe-me conduzido livre delas e guarnecido de uma indefectuosa reputação e vitória à Pátria desejada, tendo para isto igualmente concorrido a protecção do meu amado e caríssimo padrinho, S. António». Da sua bem-querença geral segue a nota escrita três dias depois: «Continuaram-se as visitas dos mais que restavam e não assistiram à minha entrada, entre os quais vieram os dessais e gentios de todas as Províncias. As tropas festejaram também a minha chegada com demonstrações públicas, de modo que asseguram os velhos que só D. João de Castro quando se recolheu da vitória de Diu mereceu semelhantes aclamações». D. António José de Noronha, nascido em Goa foi padre Franciscano em Meliapor, mas era mais guerreiro-diplomata do que eclesiástico, e foi nomeado governador da cidade, por sugestão do governador francês Dupleix, pelo soberano mogol, reforçando a fortaleza que defenderá valorosamente contra os ingleses. Mas foi por fim preso e levado para Londres e, ainda que se recusasse vender, foi liberto e recebido com honras e condecoração em França, recebendo o bispado de Halicarnase, donde regressou à Índia para colaborar com os franceses em batalhas diversas, sobretudo contra os ingleses. Em 1763, era nomeado general da província de Pondá e Zambalim do Estado Português na Índia, assegurando-a pelo seu prestígio e destemor. Carlos Malheiro Dias consagrou-lhe uma biografia romanceada e mais recentemente foram dadas à luz pela Fundação Oriente algumas obras inéditas de António José de Noronha, muito bem preparadas e contextualizadas por Carmen M. Radulet: o Sistema Marcial Asiático e o Diário dos Sucessos da Viagem que fez do Reino de Portugal para Goa, Dom António José de Noronha, Bispo de Halicarnasse.
Neste dia em 1726, o governador do Rio de Janeiro, Luís Vaía Monteiro  numa carta dirigida ao rei D. João V, descrevendo a vida dos mineiros e garimpeiros, diz que não há um só mineiro branco que possa viver sem pelo menos uma negra de Daomé, pois dizem que só com elas conseguem ter sorte. A intensificação do dinamismo psicofísico dos diversos povos convergentes no Brasil era sentida, verificada e intuída como o resultado da osmose valiosa de campos psicomórficos africanos, europeus e índios numa base amorosa e futurante, que tem gerado seres de amor, de arte e de conhecimento fabulosos, embora não haja ainda uma justiça harmonizadora e protectora de todos os seres.
                                              
Em Vadodara, Índia, nasce neste dia em 1882 Hazrat Inayat Khan. Foi iniciado em diversas fraternidades, as tariqas, islâmicas pelo seu mestre Mohammed Abu Hashim Madani, que o enviou para ser um dos primeiros divulgadores do Sufismo, a tradição mística e gnóstica do Islão, no Ocidente moderno, desde 1910 na USA e ao princípio mais como músico. Fundou a Sociedade Sufi Internacional, viajou, tocou e palestrou em muitos países e publicou vários livros de grande beleza e espiritualidade. Perguntaram-lhe: «Que pensa da vinda de Jesus? — Para mim ele nunca partiu». Dirá ainda: «O coração humano é um templo, quando a sua porta está fechada aos homens, ela está igualmente fechada a Deus. O conhecimento espiritual consiste em tomar consciência do ser perfeito que está no coração... Se negarmos a beleza divina que nos rodeia, a beleza que está no interior não nos será então revelada, porque a alma nasce com os olhos abertos para o exterior. Não vê a vida interior. O único meio de acordar para a vida interior — que é a mais bela — é ser receptivo à beleza exterior. Este mundo, com toda a beleza ilimitada que possui, a natureza com a sua sublimidade, as personalidades com imanência divina, se ignorarmos tudo isso, então, porque viemos ao mundo e o que realizaremos?» «O estado original da alma é paz e a sua natureza é o prazer e ambos trabalham um contra o outro. Eis o motivo oculto em toda a tragédia da vida».

                                        
6-VII. Em Florença, a bela, no ano de 1439, o papa Eugénio e o imperador grego João Paleólogo e representantes das igrejas orientais proclamam no Concílio: «Possa o céu alegrar-se de que o muro que durante tanto tempo separara as igrejas do Oriente e do Ocidente seja derrubado, e que dissipada a nuvem de sofrimento e de luta, a paz tenha voltado». Mas se a concordância sobre a procedência do Espírito Santo do Pai e do Filho, e sobre a autoridade suprema de Roma, fora então obtida, as circunstâncias da derrota das tropas cristãs em Varna, na Bulgária, em 1444, face ao exército otomano e a queda de Constantinopla, em 1453, impedirão a concretização da unificação religiosa. Deste encontro, segundo Marsilio Ficino (na imagem com Pico della Mirandola e Poliziano), originou-se a famosa Academia Platónica, cuja principal reunião era o Banquete a 7 de Novembro, data do aniversário e morte de Platão, que entre nós o professor José Vitorino da Pina Martins celebrou também algumas vezes com um pequeno grupo de almas.
O gigantesco Duarte Brandão, general de armada e cavaleiro da Ordem da
Jarreteira, vem a Portugal e arma cavaleiro dessa Ordem inglesa, cujo mote é Hony soit qui mal y pense, «Maldito seja quem disto pensar mal», o rei D. Manuel, neste dia em 1512. No convento de Cristo em Tomar, na fachada ocidental, está representada numa das torres que circunda a significativa janela do capítulo, o cinto da Ordem da Jarreteira...
 
O humanista Tomás More é decapitado neste dia em 1535 por recusar-se a aceitar que o rei Henrique VIII (1491-1547) se tornasse o chefe da igreja Católica em Inglaterra. Nascido em 1475 de um advogado e depois juiz , segundo de seis filhos, estagiou como pagem do Arcebispo de Cantuária e Chanceler do Reino John Norton que muito o apreciou e o enviou para estudar em Oxónia (Oxford), onde esteve de 1492 a 1494 sendo aluno de dois primeiros humanistas ingleses, Thomas Linacre e William Grocyn, e passando a dominar excelentemente o latim e o grego. O seu pai insistiu para que que estudasse no Lincolon's Inn em Londres, uma universidade mais avançada, o que ele fez. Grande amigo de Erasmo, admirador de Pico della Mirandola, de quem traduziu a biografia para inglês, Chanceler do Reino (1532-1535), preferiu manter-se fiel à sua consciência do que sobreviver à custa da aprovação do que considerava errado. Na obra a Utopia (1ª edição em Lovaina, 1516), em que são transmitidos os ideais duma nova Era mais equitativa e sábia, quem dialoga com Tomás More é um português: «Rafael Hitlodeu (este é o seu nome de família) conhece bastante o latim e sabe o grego na perfeição. Como se dedicou predominantemente à filosofia, cultivou a língua de Atenas mais que a de Roma. Eis porque, em questões de certa importância, vos citará apenas passos de Séneca e de Cícero. Nasceu em Portugal. Ainda novo, renunciou à fortuna paterna para os irmãos e levado pela intensa paixão de conhecer mundo, ligou-se a Américo Vespúcio e seguiu-lhe a sorte. Nem por um instante abandonou este grande navegador em três das suas quatro últimas viagens, cuja narrativa é hoje feita em tantos livros... Sem a protecção divina, o seu temperamento sedento de aventuras ter-lhe-ia sido fatal. Seja como for, depois de Vespúcio partir, Rafael percorreu com cinco castelhanos múltiplas regiões, desembarcou como que por milagre em Ceilão, e dali seguiu para Calecut, onde um navio português, contra todas as esperanças, o reconduziu ao seu país». Thomas More, John Fischer, uns dias antes dele também decapitado, e John Colet representam o humanismo mais puro de Inglaterra e por isso simpático com o ideal que os navegadores portugueses poderiam atingir e incarnar. Entre nós José V. de Pina Martins e Fernando de Mello Moser foram dos que mais o amaram e trabalharam e divulgaram.
  Thomas More, canonizado como santo mártir, com John Fisher, em 19 de Maio de 1935, pela Igreja Católica. 
Helena Petrovna Blavatsky comTallapragada Subba Row, em 1884.
 
Nasce neste 6 de Julho de 1856 Tallapragada Subba Row, e depois de ter estudado Direito, encontrando-se um dia em 1882 com os dirigentes teosofistas Helena P. Blatavsky e Coronel Olcott sentiu grande despertar interior e passou a manifestar a sabedoria tradicional indiana quase de cor, explicando mais tarde que o seu mestre trouxera ao de cima a sabedoria das vidas passadas. Foi quem indicou e apoiou Blavastky a decidir-se por Adyar em Madras como a sede do movimento teosófico e foi durante uns seis anos um bom transmissor da sabedoria indiana dentro dos meios indianos e teosóficos locais. Infelizmente quando Blavatsky lhe passou o manuscrito da Isis sem Véu para ele apreciar e dar o seu parecer e editar sentiu uma repulsão interior tão forte pelo seu conteudo que disse que tal obra teria que ser completamente corrigida e modificada, apresentando logo de seguida, em 1888, a sua demissão da Sociedade Teosófica. No meio deste conflito, e quando se deslocara
em 1890 à sede da Sociedade Teosófica em Adyar, contraiu  uma doença na pele infeciosa e em poucos meses, a 24 de Junho de 1890, desincarnou, com os 33 anos crísticos. Deixou porém algumas obras ainda hoje bem valiosas, e foi mais um dos que corajosamente puseram em causa as mistificações e trapalhices de Blavastky e que ainda hoje são editadas e acreditadas por tanta gente, nomeadamente em Portugal onde para alguns são  quase como bíblias...
Dia 7-VII. Vigília de Vasco da Gama e dos seus capitães na ermida de Santa Maria de Belém (dos Reis Magos do Oriente), casa dos freires da Ordem de Cristo, em 1497, donde partirão no dia seguinte rumo à Índia. Lusíadas: «Partimo-nos assim do Santo Templo / que nas praias do mar está assentado, / Que o nome tem da Terra para exemplo, / Donde Deus foi em carne ao mundo dado.» Eram as vigílias iniciáticas, em que o despertar do espírito, intensificado pela aspiração ao Divino, fendia as limitações corporais.
Não chegou a viver na Índia dois meses frei Pedro da Covilhã, capelão e confessor da frota de Vasco da Gama na viagem de 1498, talvez quem celebrou a primeira missa num ilhéu junto à ilha de Moçambique onde «todos comungaram com muita devoção estando confessados da noite passada», pois morre mártir segundo alguns autores, ou então doente, neste dia. Tinha sido o prior do mosteiro da Ordem da Trindade em Lisboa.
D. Constantino de Bragança, já regressado a Portugal
e de mãos limpas, morre em 1575. Vice-rei entre 1558 e 1561, destacou-se pela sua intrepidez e boa administração, embora algo opressivo ou fanático religiosamente, conseguindo controlar as cobiças e ambições que tendiam a apoderar-se de muitos dos portugueses em paragens tão ricas e tão quentes. Enviado pela viúva de D. João III D. Catarina e seguidor duma estratégia de expansão territorial para a qual não teríamos fatalmente reservas, viu no seu governo a entrada da Inquisição e na sua mente de religioso ortodoxo católico não havia oposição à perseguição às outras religiões. Aquilino Ribeiro, biografando-o, diz: «O seu fanatismo era a fruta cariada do tempo. Pode dizer-se dele que foi governador probo, moderado de paixões, exacto de consciência, uma boa vontade em acção» Culturalmente protegeu Camões, libertando-o de acusações quanto ao exercício dum cargo em Macau e da prisão onde estava. Pode ter participado em alguns diálogos mais sábios com o poeta e com Garcia de Orta. A destruição que determinou em 1561 dum dente de Buddha, o dalada, capturado no Ceilão, foi uma perda grave para o património mundial, a ser verdadeiro...
O Padre Gaspar Soares em 1611, numa carta em que
quer justificar a necessidade de colégios em Moçambique, alega o desabafo do povo: «Padres, vossas reverências não querem senão habitar em terras e climas sadios e gostosos, sendo pregadores evangélicos, pois nós por ouro vivemos nele e estamos sãos e bem dispostos; e vão e vêm mercadores, conquistadores e soldados e vossa reverências querem-se poupar, quem há-de ajudar a estes pobres cafres em sua salvação por quem Deus também morreu?».
 
 Nasce em Ucanha neste dia 7 de Julho em 1858 José Leite de Vasconcelos,  notável arqueólogo, etnógrafo e filólogo,  peregrino e amante da preservação dos monumentos e memórias do passado, distinguindo-se  na sua longa vida de 82 anos por numerosas e valiosas publicações de livros e revistas e pela fundação do Museu de Arqueologia e de Etnologia de Belém, em 1893. Na sua obra De Campolide a Melrose. Relação de uma viagem de estudo de Filologia, Etnografia, Arqueologia, de 1915, refere alguns aspectos indianos a propósito do seu encontro com Vicente Bragança da Cunha: «O Sr. Bragança da Cunha ocupa-se entusiasticamente da Literatura portuguesa e prelecciona sobre ela na Universidade de Londres, o Sr. Almeida Azevedo dedica-se à advocacia. Se não fosse o Sr. Cunha eu não haveria tirado todo o proveito que tirei da visita de Londres. Acrescentarei que também por sua interferência recebi convite para passar uma tarde em casa do Sr. Ivens parente do conhecido africanista do mesmo apelido: ao agrado da convivência, e de outra vez ouvir falar português, juntou-se-me o ter ensejo de conhecer dois estudantes budistas de Ceilão, que me recitaram orações búdicas, e um dos quais trazia consigo junto ao corpo um amuleto de ouro, em cuja poderosa virtude acreditava piamente. Tão complexa é a psique do homem, que num mesmo individuo ela pode orientar-se por um lado no caminho da verdade, e por outro no da superstição!» Embora considerando superstição a crença nas relíquias ou amuletos, Leite de Vasconcelos parece pelo menos considerar as orações como fazendo parte do caminho da verdade.
Chegam a Benguela em 1877 Hermenegildo Capêlo e Roberto Ívens, e com Serpa Pinto iniciam longas e aventurosas expedições geográficas entre Angola e Moçambique.
8-VII. O historiador quinhentista João de Barros conta-nos: «E quando foi ao embarcar de Vasco da Gama, os freires da casa [da Ordem de Cristo, na imagem em cima numa aguarela de Roque Gameiro, que escolhi para um artigo, único, na revista 2.000 do Expresso] com alguns sacerdotes, que da cidade lá eram idos dizer missa, ordenaram uma devota procissão, em que o levavam ante si nesta ordem: ele e os seus com círios na mão, e toda a gente ficava detrás, respondendo a uma ladainha que os sacerdotes diante iam cantando, até os porem junto dos batéis em que se haviam de recolher. Onde, feito silêncio e todos de joelhos, o Vigário da casa fez em voz alta uma confissão geral e no fim dela os absolveu na forma das bulas que o infante D. Henrique tinha havido para aqueles que neste descobrimento e conquista falecessem». Já o Diário do participante na viagem Álvaro Velho regista: «Em nome de Deus, Amem. Na era de 1497, mandou El-Rei D. Manuel, o primeiro deste nome em Portugal, a descobrir quatro navios, os quais iam em busca de especiaria, dos quais navios ia por Capitão-mor Vasco da Gama e dos outros, de um deles Paulo da Gama, seu irmão, e de outro Nicolau Coelho. Partimos de Restelo um sábado, que eram oito dias do mês de Julho da dita era de 1497, nosso caminho, que Deus Nosso Senhor deixe acabar em Seu serviço. Amem». Assim principiava a viagem de Vasco da Gama e dos seus 150 a 170 homens em três naus e uma de mantimentos para a descoberta do caminho marítimo para a Índia. Estava iniciada a ligação mais estreita entre os dois irmãos separados, Oriente e Ocidente. O Prestes João da Cristandade e as míticas Índias, que eram o santo Graal de Portugal já há alguns anos, vão começar a ser desvendados e milhares de portugueses partirão nessa demanda que tanto exigia seres heróicos, como podia gerar rapinadores. Camões nos Lusíadas, Fernão Mendes Pinto na Peregrinação e outros historiadores e escritores imortalizarão esta gesta repleta de dualidades de motivações e comportamentos, de grandezas e misérias.
Jorge Álvares, dos primeiros portugueses a chegar à
China e ao Japão, amigo de Fernão Mendes Pinto, protector de S. Francisco Xavier, tendo escrito a primeira monografia ocidental sobre o Japão, «é terra bem assombrada e graciosa... as mulheres são muito bem proporcionadas e muito alvas e tocam de arrebique e alvaiade», morre neste dia em 1521 na ilha de Tamão, em Cantão. O historiador João de Barros escreve nas Décadas da Ásia, começadas a ser publicadas em 1552 «E embora aquela região de idolatria coma o seu corpo, pois por honra de sua pátria em os fins da terra pôs aquele padrão, não comerá a memória de sua sepultura, enquanto esta nossa escritura durar».
                                            
O sábio aveirense Aires Barbosa, discípulo de Angelo
Poliziano e condiscípulo do futuro papa Leão X em Florença, mestre de grego e latim na Península, onde ensinou o cardeal D. Henrique e André de Resende, autor da Antimoria, na qual se deixou levar na corrente anti-erasmiana da ortodoxia conservadora católica, professor muitos anos em Salamanca, morre neste dia 8 de Julho de 1530, em Esgueira.
Na quinta do Paraíso (Almada), em que vivia
merecidamente depois dos 21 anos de peregrinações purgatoriais (13 vezes cativo e 17 vendido) enfrentadas ousadamente, Fernão Mendes Pinto, o autor da imortal Peregrinação, que se sentira volta e meio chamado por Deus, parte para a mais misteriosa viagem, em 1583, em paz: «quando vejo que do meio de todos estes perigos e trabalhos me quis Deus tirar sempre em salvo e pôr-me em segurança, acho que não tenho tanta razão de me queixar por todos os males passados, quanta de lhe dar graças por este bem presente, pois me quis conservar a vida para que eu pudesse fazer esta rude e tosca escritura que por herança deixo».

                                       
Natural de Lisboa, o P. Luís Fróis, depois de trinta e quatro anos de ardoroso apostolado, grande empatia pela alma japonesa e de animadas conversas com Nobunaga e os monges, autor de dezenas de cartas e relatos do encontro luso-nipónico e da História do Japão (cuja introdução sobre a religião japonesa está ainda hoje perdida), deixa neste dia o corpo físico em Nagasaki em 1597, então a grande cidade dos portugueses, infelizmente arrasada com a sua população pela bomba atómica norte-americana em 1945. É grande o apreço dos japoneses pela sua obra, norteada como ele diz, por «não discrepar do fio da rectitude da verdade».
                                        
A discípula de Sri Ramakrishna, Gopaler Ma, muito dotada de visões e estados de beatitude fortes, e que depois da sua morte apoiou bastante Sarada Devi, a mulher de Ramakrishna e o seu discípulo Swami Vivekananda, sai do corpo ao som do mantra, ou fórmula sagrada: Om Ganga Narayana! Om Ganga Narayana Brahma, e a forte corrente do rio Ganges leva o que resta duma alma agora mais livre, neste dia em 1906. 

9-VII. D. Vasco da Gama, na sua 2ª viagem, chega com parte da armada a Quíloa em 1502, encontrando já D. Estêvão da Gama lá com os restantes navios. O rei local é obrigado a prestar um tributo anual e poucos dias depois, conta-nos Gaspar Correia nas suas Lendas da Índia, 200 mulheres fogem para os barcos queixando-se dos maus tratos dos maridos, mas Vasco da Gama fá-las retirar, com a promessa e garantia de não serem castigadas em terra.
                                          
A Assembleia e o Senado francês aprovam finalmente em 1962 o acordo de 1956 de entrega à União Indiana das suas possessões na Índia centradas na cidade de Pondichery onde, ao contrário das dos portugueses, se fazia então um profundo estudo da cultura e religiosidade indianas. Foi o ministro Colbert quem, fundando a Companhia Francesa das Índias Orientais em 1666, impulsionou a ligação entre França e a Índia, obtendo-se uma feitoria em Surate em 1668 e Pondichery desde 1674. Será esta cidade, onde Dupleix e a sua mulher Joana de Castro governarão com brilho algum tempo, que se tornará o centro não só difusor da cultura francesa, mas também da indiana. Sylvain Lévi, Vallée-Poussin, Louis Renou, Masson-Oursel, Jean Herbert, Lizelle Reymond, Olivier Lacombe, René Daumal, Filliozat, Thérèse Brosse e Alain Daniélou serão alguns dos indianistas duma longa tradição francesa ainda hoje viva. A escolha de Sri Aurobindo e da francesa a Mãe de viverem muitos anos nesta bela cidade costeira num ashram, e depois a construção da cidade do futuro Auroville, permitem a esta zona do Tamil Nadu ser hoje bastante internacionalizada e alternativa. S. João de Brito também por aqui peregrinou.


10-VII. A cruz branca aberta em vermelho da Ordem de Cristo no velame redondo da caravela algarvia Bérrio entra na barra de Lisboa em 1499 capitaneada por Nicolau Coelho, fidalgo da casa del-rei, e pilotada por Pêro Escobar, concluindo-se a 1ª ligação marítima entre a Índia e o extremo da Europa. A alegria do rei e reino foi grande, embora a partir daí, como dirá por experiência Fernão Álvares do Oriente, «fomos varrendo as águas por cima dos ossos de varões ilustres, que nas entranhas do mar salgado ali ficaram para sempre sepultados». Uns dias antes, em Sintra, D. Manuel recebera a notícia da vinda próxima da Bérrio por uma caravela açoriana, já que aí aportara e se demorava Vasco da Gama a prestar os últimos cuidados ao seu irmão Paulo no leito da morte. Dos relatos resultou o rei crer que os indianos eram cristãos, e tal é sinal que certa unidade religiosa foi sentida, e só depois da chegada das outras naus, e em que vinham cinco indianos, é que se desfez a impressão. Nicolau Coelho, um dos muitos homens do verdejante Entre-Douro-e-Minho que chegaram ao Oriente, «de trabalhos mui grande sofredor», como dirá Camões, capitaneará ainda nas frotas de Pedro Álvares Cabral e de Francisco de Albuquerque mas, em 1504, ao regressar, desaparece com a sua nau Faial, dissolvendo-se no oceano profundo, o elemento maior da sua imortalidade histórica. Está representado num medalhão do claustro do Mosteiro dos Jerónimos.
                                 
 Nasce em Kobe, Japão neste 10 de Julho, de 1888, Kagawa, um japonês que após uma infância bem difícil, não aceite pelo pai, desenvolve um amor ao conhecimento que o levou a ser chamado o "transcendalista", por ler tantos livros de filosofia e religião, desde que entrara para a colégio presbiteriana de Kyoto, onde se destacará pois aliava à teoria uma prática de amor ao próximo imensa, defendendo o socialismo e a não violência de Tolstoi, que muito apreciava. Formado no Cristianismo, com a sua sensibilidade aprofundará bastante a mensagem de Jesus ou mesmo de S. Francisco de Assis, numa clara fusão do Oriente e do Ocidente.
 
11-VII. Retido Vasco da Gama nos Açores, pela morte do seu irmão Paulo da Gama, acabou por ser Nicolau Coelho o primeiro a chegar ao rio Tejo em 1499, na Bérrio, seguindo-se João de Sá noutra nau, e Vasco da Gama só acostará no fim de Agosto. Vieram cinco indianos, dos quais o muçulmano se fez cristão, enquanto os hindus mantiveram-se na sua sabedoria milenária, com a qual, provavelmente enriquecida, regressarão à Índia. Todos os sobreviventes foram bem recompensados e a venda da carga rendeu 60 vezes a despesa da armada. De fora, porém estavam as perdas humanas e as lágrimas que salgarão já não só a terra, como Jesus abençoara, mas o próprio mar, como Fernando Pessoa poetizará. A união entre o Oriente e o Ocidente iria contudo fazer-se muito à base da incompreensão, cobiça e violência, e só nos dias de hoje é que o comércio decorre normalmente, a independência política é um facto geral e a circulação cultural e religiosa tende a fazer diminuir preconceitos e fanatismos e a aumentar a catolicidade, ou seja, a universalidade do Espírito divino, e já não só de Roma, Meca, Bodhi Gaya, Jerusalém, Amritsar, Lhasa, Ise, ou Varanasi.
O sheique de Quíloa em 1502 torna-se tributário do rei de Portugal, através de Vasco da Gama, que seguia para a Índia na sua segunda viagem, pagando uma soma em ouro mais simbólica do que em quantidade (e da qual Gil Vicente lavrará a sublime custódia de Belém), e recebendo uma bandeira das quinas que percorreu a cidade em procissão, com o língua ou intérprete Gaspar da Gama a dirigir as ovações e pregões ao rei de Portugal.


12-VII. Breve do papa Júlio II em 1506 concede indulgência plenária de todos os pecados aos fiéis de ambos os sexos que por ordem do rei de Portugal passarem à Índia, ou nela morarem ou morrerem.
                                         
Desidério Erasmo de Roterdão, um dos maiores sábios de sempre, deixa a vestimenta terrena neste dia 12 de Julho de 1536. André de Resende escreve a Damião de Goes contando-lhe como sonhou ouvir uma voz: «extinguiu-se para o mundo aquele que era o ornamento que os séculos nunca chorarão suficiente». E apela: «aqueles que profanaram a sua reputação acusando-o de heresia, aprendam agora a moderar as suas sevícias e deixem ao menos intactas as suas obras que a posterioridade grata poderá venerar e honrar». Infelizmente não sucedeu assim e em Portugal o espírito aberto e sábio do humanismo não conseguiu sobreviver às pressões do fanatismo ortodoxo, da Inquisição e da censura. Pouco antes de morrer, Erasmo, que dedicara um livro a Damião de Góis, desejara que só os mais puros missionários participassem nos Descobrimentos e na sua evangelização. O Elogio da Loucura, os Colóquios, os Adágios e a sua versão do Novo Testamento são obras muito valiosas. Entre nós em 2008 traduzi com Álvaro Mendes o Modo de Orar a Deus, nas publicações Maitreya, e comentei-o com profundidade, depois de ter contextualizado a obra e as metodologias de oração, bem como biografado Erasmo.
                                       
No mesmo dia de 1536, o arcebispo embaixador do Preste João em Portugal, Saga Zab, quase que excomungado em Portugal e proibido de comungar, escrevia em Lisboa ao rei D. João III: «Peço-lhe por amor da morte e paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo, e por a grandíssima piedade da bem-aventurada Sua Madre Nossa Senhora, que não queira que eu morra dentro em seu Reino». Damião de Goes será uma das testemunhas atentas e compreensivas do cristianismo oriental, que para a ortodoxia católica estava infectado com a heresia nestoriana e o judaísmo.
Em 1553, depois de esforçados anos na Índia, D. João de Abranches depõe na Inquisição em defesa dum capitão acusado de irreverência pela cruz, alegando que só lhe ouvira dizer que as obras de Melanchton não eram defesas. Virá a morrer em Alcácer Kibir.

Shri Mahesh Ghatradyal nasce no Sul da Índia em 1924 e virá para França como atleta nos anos 40 e cedo se tornou um embaixador da cultura e da espiritualidade indiana, tornando-se professor de Yoga e fundador de associações e fundações até se libertar do corpo terreno em 21 de Agosto 2007. Num dos seus valiosos livros, e que diferença para o que se lê ou ensina na generalidade em Portugal, Le Bhakti de Akkamaha Devi Shiva-Yoga,«dedicado com toda a humildade à memória da senhora Indiradevi Appasaheb Adke, a todos os que procuram a verdade, a todos os que vivem para a sabedoria divina, a todos os que aspiram ao objectivo final da felicidade eterna. Om Namaha Shivaya». Fala depois nas fases do caminho de diminuição da ignorância e da dualidade. referindo a Pranalingisthala, isto é, a realização da luz interior, caracterizando-a muito bem: «Os adeptos de Siva-Yoga chamam Pranalinga à luz produzida pelo reencontro do sopro superior (prana) e do inferior (apana). A luz entrevista ou Jyotirlinga situa-se entre as duas sobrancelhas. Esta etapa da realização da luz interior é conhecida como Pranalingashtala e é um processo assente num alto nível de concentração. Quem tem a força subtil ou prana a  circular pelo meio da espinal medula ou sushuma é verdadeiramente um Pranalingi. Quando o prana corre ao logo na medula, os órgãos dos sentidos adormecem, o sopro acalma-se, o espírito-mente torna-se calmo e fixa-se sobre a visão eterna da Beatitude Divina, Shiva. Quando o som ressoa, a representação pictórica do prana emerge diante do olho espiritual do Pranalingi, que ouve o som e simultaneamente vê desfilarem múltiplas cores diante do seu olhar. Se o prana se torna regular e rítmico, todos os órgãos dos sentidos que são comandados por ele tornam-se sensíveis ao jogo das visões. Quando a respiração começa a fluir ao longo da coluna, a paz brota abundantemente. O devoto obtém a visão de Shiva. Todos os grandes místicos da fé Lingayat cantaram e honraram Pranalingashtala: «Não é imaginável a luz no olho, não é descritível o som no ouvido, incomparável é o sabor na boca, incompreensível é a paz que brota do nervo central, Omnipresente é o grande Senhor, o Imutável, o Subtil, o Imortal». Que diferença com a Yoga ensinada em Portugal em associações e federações ora meramente comerciais, ou de malabarismos ou sectárias. Aum Jyoti Aum...

13-VII. «Como pelas duas horas depois da meia-noite falecesse o vice-rei e antes do seu enterro se hão-de abrir as vias de sucessão na casa Professa de Bom Jesus, por se achar na mesma igreja o corpo do dito senhor, são convidados a presenciar a abertura das cartas devendo ainda os superiores dos conventos mandarem dobrar os sinos desde que saibam do sucedido», 1723. Era o vice-rei Sampaio e Castro que morrera, depois dum reinado em que o corsário Kanoji Angriá muito trabalho e despesa causou aos portugueses e aos ingleses de Bombaim, que se uniram mesmo para o combater. Mas o que eram senão corsários muitos dos portugueses e europeus, quando batalhavam pelos saques das pobres naus de comércio ou de zonas costeiras? E assim os portugueses, sobretudo na zona da Bengala, ficaram conhecidos por piratas, pois por lá a influência controladora do Estado e dos vice-reis pouco se sentia, de tal modo que ainda hoje a palavra armada significa portugueses.
Luciano Cordeiro (1844-1900), professor de Filosofia e Literatura do Colégio Militar, no discurso de entrega aos finalistas do Curso, pronunciado neste dia em 1871, em Mafra, onde na altura estava instalado, e recomenda-lhes manterem bem luminosos na travessia do oceano da vida o farol da ciência, «farol esplêndido que delata os recifes traiçoeiros, as pérfidas ressacas. Ilumina a rota, alenta os ânimos, aparta as névoas, indica o porto» e a bússola da consciência, «bússola fiel  que dirige e salva a frágil embarcação: é a consciência ilustrada e honesta; a consciência que não entibiam as borrascas, que não fascinam  os esplendores  ilusórios, que não enganam as serenidades traidoras; a consciência que tem por polos o verdadeiro e o justo; isto enfim que constitui o homem de bem e que é o grande bem do homem nas horas de provação amarga como nas horas de deleitosa ventura», o farol mostrando a verdade, e a bússola a justiça. Porá ainda em causa o excesso de louvor da guerra e as grandes epopeias comparado com o da ciência:«Assombram-nos, encantam-nos a Ilíada, o Ramayana, o Shahnameh, a Eneida, o Livro dos Heróis, as Nibelungen, os Edas, os poemas gaélicos em que Mac-Pherson compilou as proezas lendárias dos filhos de Erin... (...) Todos conhecemos Geraldes Sem-Pavor e fazem-se romarias, creio, à peça [canhão] de Diu: mas esquecem-se os nome de Pedro Nunes ou do infante D. Henrique, ou de Bartolomeu de Gusmão, o precursor de Mongolfier.»
                                       
14-VII. O vice-rei (de 1758 a 1765) conde de Ega, Manuel de Saldanha Albuquerque, 74º Governador da Índia Portuguesa, proíbe que sejam proferidas denominações injuriosas contra os naturais da Índia, neste dia em 1759.
A Revolução Francesa em 1789 triunfa e as ondas provocadas por este acontecimento atingirão num sentido democratizante e laicista toda a Europa e os seus prolongamentos no mundo, consagrando-se pelo menos em teoria os direitos e liberdades individuais, marcados na trilogia Liberdade, Igualdade e Fraternidade, originada talvez no pensamento de Claude Saint-Martin. Este dia torna-se a ocasião comemorativa da República de França.
                                                 
Nasce em 1854, em Calcutá, em família culta e brahmane Mahendra Nath Gupa. Formar-se-á em psicologia, será professor e director dum liceu, embora seguindo intensamente as práticas espirituais, primeiro do grupo Brahmo Samaj e depois do notável místico e iniciado Ramakrishna. Virá a ser o autor dum diário do que se passava com o mestre, o qual será editado como o maravilhoso Evangelho de Ramakrishna, tão elogiado por Max Muller, Aldous Huxley e Romain Rolland. Discípulo fiel e lúcido, iluminado e discreto (pois só assinou como o discípulo M.) dirá: «O Mestre era como um grande peixe a nadar alegremente em águas calmas, claras, azuis, o oceano de Satchidananda (Ser, Consciência e Felicidade)», oferecendo-nos ainda a afirmação de Ramakrishna de que "com a realização divina todo o karma cai." Viveu até 4 de Junho de 1932.
António Quadros, um dos cultores no século XX da especificidade da Tradição e do Pensamento Português, nasce em 1923 em Lisboa. Na sua vasta obra de ensaísta, por vezes demasiado nacionalista, destaca-se Portugal, Razão e Mistério, na qual aborda as possíveis e míticas missões de Portugal.  Dinamizou várias revistas e o IADE, onde organizou colóquios ou ciclos de palestras valiosos, tendo eu próprio participado. Foi amigo convivente de Dalila Pereira da Costa, Afonso Botelho, Álvaro Ribeiro, Lima de Freitas, Agostinho da Silva, Barrilaro Ruas, Bigode Chorão, Brás Teixeira, Pinharanda Gomes, e muitos mais, sem duvida uma figura marcante na cultura de raiz portuguesa aberta aos mitos, à escola da filosofia portuguesa e à antropologia espiritual.
 Em 1963 no seu ashram em Rishikesh, nas margens do rio Ganges ao fim de 76 anos de vida terrena o médico, yogi e prolífero escritor Swami Sivananda, permanecendo ainda hoje viva, ainda que algo parada em termos de investigações e publicações novas, a sua instituição ou ashram de Yoga Vedanta. Talvez tenha deixado o seu ego ser adulado um pouco demais, mas na Índia por vezes assume-se demasiado literalmente que o guru e Deus são um...
                                       
            Swami Shivananda, com dois discípulos e uma estátua sua para ser animada por pujas.
O P. Henri le Saux, ou Swami Abhishiktananda (30-VIII-1910 a 6-XII-1973, é agraciado neste dia em 1973 com a sua experiência de gnose última e para além da vida e da morte, pouco mais tendo para realizar na Terra «Quem consegue suportar a glória da transfiguração, do homem morrer como transfigurado; porque o que Cristo é EU SOU! Uma pessoa só pode falar disto depois de ter sido ressuscitado da morte... Na fronteira de dois mundos, eu estava magnificamente calmo, pois EU SOU, não importa o quê no mundo! Encontrei o Graal».
Imagem dele:
                                               
15-VII. «Em nome da Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo, três pessoas um só Deus. Saibam quantos este instrumento de contrato virem que no ano de nascimento de N. S. Jesus Cristo de 1523 aos 15 de Julho em a cidade de Medina principal cabeça do reino e do senhorio de Ormuz dentro da fortaleza e torre de menagem dela estando aí o grande senhor Dom Duarte de Menezes capitão geral e governador das Índias e capitão e governador da cidade de Tânger e Rey Xaraffo gozil e governador da dita cidade de reino (...)», assim se iniciava uma cooperação entre o reino de Ormuz e os portugueses, sendo estes obrigados a defendê-los perante certas estipulações de pagamentos. Fora Afonso de Albuquerque quem conquistara Ormuz no fim de Outubro de 1507 e propusera este tipo de acordos que funcionarão até os holandeses expulsarem os portugueses. Alguns castelos no golfo Pérsico e no Irão conservarão a memória da presença lusa.
O P. Inácio de Azevedo e 40 jesuítas são lançados pela borda fora do barco em que rumavam para o Brasil em 1570, pelos protestantes calvinistas holandeses. A luta fratricida na Europa central ampliou-se até aos confins do Oriente, e em 1639 quando os portugueses eram expulsos de Nagasaki definitivamente, os holandeses em Hirado celebravam uma missa de acção de graças. Os pastores e missionários, talvez sobretudo mais os protestantes, eram por vezes demasiado bélicos, nacionalistas e mercantis...

16-VII. O navegante e comerciante veneziano Alvise Cà da Mosto (nascido em 1432) morre em 1483 na bela cidade do Adriático, depois de ter navegado ao serviço do infante D. Henrique, na exploração inicial da costa de África, deixando escrito as Navigazioni, em que narra as suas expedições e as de Pedro de Sintra. Na ilha da Madeira apreciara os pavões selvagens e a vinha que produzia quase mais uva do que folha. Com os almirantes Pessanhas, Toscanelli, António Noli e Américo Vespúcio foi dos italianos que contribuiu para a liderança portuguesa dos descobrimentos.
Manuel Godinho de Erédia, filho de pai português e da princesa de Supa de Macassar, nasce em Malaca em 1563. Bom aluno, apaixonado pela geografia, abandonou a Companhia de Jesus e veio a ser nomeado cosmógrafo do reino e depois descobridor pelo vice-rei Aires Saldanha, admitindo-se a hipótese de ter chegado até à Austrália. As suas obras são notáveis e os seus desenhos perfeitos, tanto de barcos e fortalezas, como de brasões e mapas.
                                         
17-VII.
O excerto duma carta de S. João de Brito em 1686 a narrar os seus padecimentos: «Dia de Santo Aleixo, vindo de viagem me prendeu o Pradani do Marávà, Cumarà Pulley, tomou-nos tudo, quis que dissesse-mos Xivá, Xivá, que nos largaria dando-nos de tudo, que nos faria honra e daria licença para pregar a lei de Deus, e me daria uma aldeia e um cavalo. Respondi, e seis cristãos, que foram presos comigo, que não havíamos de dizer tal nome; eu fui logo esbofeteado, e lançado em dois grilhões, e amarrado ao cepo dos Párias na rua aquela noite». E respondeu-lhes então que os adoradores de Vishnu, chamam por Vishnu, os de Shiva por Shiva, e ele tendo por Deus o criador do céu e da terra só a esse podia chamar. Mas se já soubesse que Xiva quer dizer a realidade suprema, ou o bem-aventurado, e que as estátuas e nomes são só aproximações a Deus?
                                                         
O P. Bartolomeu de Quental dá neste dia em 1668 os estatutos especiais e inicia a vida comunitária da sagrada Congregação do Oratório em Portugal, que se distinguirá muito no ensino, e que fora fundada por S. Filipe de Néri, o santo do coração ardente que nomeara em Roma seu testamenteiro o humanista português Aquiles de Estaço. Pouco depois Bartolomeu Quental, tio-avô do nosso Antero de Quental, também ele um místico e idealista, envia alguns dos membros da Congregação para a missionação da Índia, vindo a ordenarem-se sacerdotes indianos notáveis, tal o goês José Vaz (21-IV-1651 a 16-I-1711 ) que veio a ser canonizado em 2015.
O P. Jácome Gonçalves, brâmane de Goa, missionou o Ceilão durante trinta e três anos. Companheiro de S. José Vaz nessa tarefa, observou que este só dormia duas horas e «aquela jaculatória Oh! meu Jesus, que, nos seus sermões, fazia em Goa rebentar os corações, ainda lhe ouvi aqui algumas vezes, entre os suspiros que lança, de dia e de noite». Escreveu em cingalês e tamul dicionários e várias obras religiosas das quais se destaca o Dharmodhyanaya, uma compilação de vidas de santos, onde surge a de S. Barlaão e Josafat e outras, também com influências budistas. Cantando o Te Deum Laudamus pela vinda do seu sucessor e a do mundo espiritual, liberta-se com alegria do corpo físico neste dia em 1742.
Nasce em Buti, Pisa, em 1877, Ferdinando Belloni-
Felippi. Tornar-se-á professor de sânscrito e um notável indianista com traduções e estudos muito valiosos sobre a filosofia e a literatura indiana, o Budismo e as Upanishads. Dos autores literários publicou sobre Bhavabhuti e Rabindranath Tagore.

                                       
18-VII. À uma hora da manhã, em 1697, o P. António Vieira abandona o corpo, depois de muitos anos de anjo e advogado de tantas causas de Portugal e do Brasil quantos os seus notáveis sermões, e certamente ainda em busca da luz que sempre procurara e tanto vaticinara. Numa carta ao sábio Duarte Ribeiro de Macedo diz que ele e «eu éramos os verdadeiros químicos, porque ambos me parece termos descoberto a pedra filosofal» que Portugal precisava, e que era revogar a lei do rei D. Manuel que mandara arrancar todas as plantas indiáticas que se davam no Brasil, tal a pimenta, e obter-se assim abundância de drogas que podiam ser vendidas na Europa a menor preço que o da concorrência. Pensou também que «conhecera os arcanos de Portugal, e até onde chegam as chaves do seu segredo», mas como todos os que tentam antecipar o futuro, acabou tanto por navegar em zonas onde as miragens se formam facilmente, acabando por ser detido no porto aferrolhado da Inquisição. O tema da fraternidade humana foi por ele pregado constantemente: «As nações, umas são mais brancas, outras mais pretas, porque umas estão mais vizinhas, outras mais remotas do sol... Os homens de qualquer cor são todos iguais por natureza e mais iguais ainda por fé, se crêem e adoram a Cristo. Não há diferença de nobreza, nem diferença de cor, porque todos são filhos de Deus.»
                                      

19-VII. A rainha D. Filipa de Lencastre, cuja divisa era "Por bem", depois de demorada discussão se era lícita a guerra santa, entrega as espadas e as missões aos seus filhos nas vésperas da partida para Ceuta e com 55 anos harmoniosamente vividos deixa o leito da morte, partindo para o mundo celeste durante um eclipse do sol, neste dia 19 em 1415. Mas antes entregara as espadas para os seus filhos levarem na incursão a Ceuta e assim a D. Duarte coube a espada da justiça com piedade, para reger os povos, a D. Pedro a defesa das donas e donzelas, a D. Henrique, os fidalgos. Pouco antes de morrer, sussurrou ainda: «Eu subirei no alto, e do alto vos verei, e a minha doença não estorvará a vossa ida». Fernando Pessoa admirou-a na Mensagem, ligando-a subtilmente com o Arcanjo de Portugal e o Graal:
«Que enigma havia em teu seio
Que só génios concebia?
Que arcanjo teus sonhos veio
Velar, maternos, um dia?
 
Volve a nós teu rosto sério,
Princesa do Santo Graal,
Humano ventre do Império,
Madrinha de Portugal!».
 
D. Manuel confirma neste dia 19 de Julho de 1508 a carta de cavaleiro da Ordem de Cristo ao italiano Ludovico de Varthema, armado por D. Francisco de Almeida, por serviços distintos em guerra e em paz. Escreveu um muito divulgado Itinerário, cheio de aventuras da sua longa viagem no Oriente, presente na biblioteca de Garcia de Orta, que o comentou assim: «Eu tinha este Ludovico por homem de verdade; e depois, vendo o seu livro, acho que escreveu, o que à vontade lhe veio; porque falando de Ormuz, disse que era uma ilha ou cidade a mais rica que podia ser, e tinha as mais suaves águas do mundo; e quanto a Malaca, que não havia água nem madeira alguma. Tudo isso é falso».
As crónicas mogóis relatam a apresentação ao imperador Shah Jahan de 400 prisioneiros portugueses vindos da costa de Bengala, neste dia em 1633, depois do cerco de Hugli, que se destinara a castigar os portugueses que tinham atacado certos súbditos dos mogóis, o que teve leves consequências negativas nas relações até então amistosas com os padres, Goa e os portugueses.
É promulgado em 1854 o diploma do melhoramento da educação intelectual da Índia pela difusão do conhecimento europeu através da língua inglesa, em vez de se valorizar o estudo das línguas e culturas indianas. Embora se abra um fosso entre uma minoria e o povo e se atrase o fiel aprofundamento das tradições milenárias da Índia, a divulgação da cultura europeia suscitará a fermentação do ideal duma Índia livre, luta esta que só triunfará em 1947 com a independência da União Indiana.
 
Nasce em Asola, Montova, Itália, em 1879, Ambrogio Ballini. Tornar-se-á um notável indianista e professor de sânscrito nas universidades de Pádua, Milão e Roma, de 1913 a 1949. Além dos estudos sobre os contos da Hitopadexa foi um notável especialista do Jainismo, a antiquíssima religião dos Tirtankaras e dos Jinas, os vitoriosos, profundos cultores da não-violência e do desprendimento e pureza em relação ao mundo.
                                          
O embaixador Armando Martins Janeira, poeta,
escritor e profundo conhecedor e divulgador do Japão, dos portugueses no Japão e de Wenceslau de Moraes, desencarna no Estoril, com 73 anos, neste dia de 19 de Julho de 1988. Casara aos 45 anos com Ingrid Bauer, que o acompanhou com grande qualidade na sua missão e o continuará. Deixou uma vasta obra ensaística e dirá «O significado da vida e da felicidade — todos os sábios do Oriente e do Ocidente nos ensinam — só se encontra quando o homem se dedica a uma grande tarefa, se entrega inteiramente a uma missão e se dissolve no poder imenso que o transporta para além da existência individual». Vivendo no Japão dez anos, onde ajudou a «erguer 15 monumentos comemorativos da grande obra portuguesa», um museu, uma escola infantil e um cortejo histórico, este descobridor moderno dirá: «Foi uma luta combatida e vivida num fervor de cruzada, não para ressuscitar um legado histórico, mas para inserir a História na vida de hoje e amanhã. Isto só no Japão poderia ter sido conseguido. Oxalá um dia em Portugal igual eco se levante, para que assim a obra portuguesa no Japão desça da leniente seara dos eruditos para o campo da cultura geral, e aí tome um significado vivo e universal, hodierno e criador — para que o amor entre os dois povos se engrandeça».
                                        
20-VII. Carta de Vasco Gama escrita neste dia de 1502, sobre a paz em Quíloa: «O Almirante dom Vasco, etc, faço saber a todos os capitães de quaisquer navios delrey meu senhor que a este porto de Quilloa vierem, que eu vim a XII deste mês de Julho de 1502 e me quisera ver com elrey para com ele fazer paz e amizade e ele se não quis ver comigo mas antes se ouve muito descortezmente pelo qual me armei com toda a gente que tinha com a determinação de o destruir, e me fui em meus batéis de fronte de sua casa, e puz a proa em seco e o mandei chamar muito mais descortezmente do que ele comigo se ouve. E ele ouve por seu barato faze-lo assim e veio e fiz com ele paz e amizade com tal condição que ele pague de tributo e páreas a el-rey meu senhor mil e quinhentos miticais de ouro em cada um ano, os quais mil e quinhentos miticais me logo pagou deste ano presente em que estamos e se fez vassalo de sua alteza pelo qual vos mando da sua parte que lhe guardes a dita paz em quanto eles a guardarem, assim como é razão que se faça aos vassalos do dito senhor. E isto notifico a todos em geral e aqueles que para estas partes vindes enquanto eu cá estou vos mando que não façais nenhuma demora mas logo vades caminho de Melinde...»
                                            
 Abandona o corpo neste dia em 1596 na cidade de Santa Fé do México o contemplativo português Gregório Lopes que tinha uma rara união com Deus, dizendo a cada respiração, interiormente: «Faça-se a Tua vontade». À hora da morte o P. Losa, seu biógrafo, perguntou ao passar-lhe a vela para as mãos: «Já é tempo de ir a ver o segredo, quer Vossa mercê a candeia? Gregório Lopes responde-lhe: — Não há segredo, tudo é claro, meio-dia é para mim». Dos seus vários escritos, como o Tratado das Propriedades das Ervas, só foi impresso a Explicação do Apocalipse, em 1678, em Madrid, embora fantasiosa apreciada por Bossuet. A prática da repetição de um nome de Deus, se é rara no cristianismo ocidental, ainda que mais corrente no ortodoxo, é muito praticada nas tradições orientais (o zikr dos sufis e o nama japa dos hindus) e consiste na repetição dum nome de Deus, ou de nomes-sons sagrados, que permitem a interiorização e fortalecimento anímico indispensáveis a quem se quer aproximar mais dos mistérios do conhecimento próprio e divino. É uma forma de concentração acessível e eficaz, face à habitual agitação mental (vagas após vagas de pensamentos), para que assim aquietada a superfície do mar interno, se possa reflectir a luz. Patanjali, mestre do Raja Yoga, define Yoga como citta vritti nirodha, extinção ou aquietação das vagas de pensamento, ou dos envolvimentos mentais. Surge mesmo o Japa Yoga, a união pela repetição do nome de Deus, e viajantes e padres dos Descobrimentos testemunhá-lo-ão e desta transmissão surgiu a expressão  ram ram. Não houve pois só centenas de palavras e frases portuguesas a entrarem nos idiomas orientais, natural quando no século XVI e XVII a língua portuguesa era língua franca que se falava entre ocidentais e orientais, mas também algumas orientais entraram no nosso léxico, ou certas realidades orientais universalizaram-se, tal o karma, ou lei de causa efeito anímica, e os chakras, centros de energia subtil ao longo da coluna vertebral, o nirvana, prana, o avatar, o mensageiro, ou descida divina.
                                         
Neste dia em 1887, em Boston, Mohini Mohun Chaterjee (1858-1936, familiar de Ram Mohan Roy e casado com uma sobrinha de Rabindranath Tagore) assina o prefácio à 1ª edição da sua notável tradução comentada da Bhagavad Gita, comparando-a frequentemente com o Novo Testamento, considerando mesmo:«Na Bhagavad Gita, consistindo de 770 versos, o principal assunto é o ser de Deus; enquanto que escassamente a mesma quantidade de informação é dada em toda a Bíblia. A explicação deste facto notável encontra-se na diferença entre o génio das raças Hebraicas e Bramânicas, e no facto de que os ensinamentos de Jesus se dirigiam à "pessoa comum"». Os revestimentos da Verdade (as religiões) é que têm de mudar, ou surgirem novas, para reconciliarem o mutável ser humano com a Verdade. «As Escrituras Bramânicas estão de acordo com o ensinamento de que quando o coração (chitta, em sânscrito) está purificado, Deus é visto. Jesus Cristo declara, "Abençoados os puros de coração, pois verão a Deus". Os sábios brâmanes ensinaram com bastante força que o caminho mais fácil para a pureza do coração é o amor de Deus e o amor das suas criaturas (...) Jesus advertiu em Mateus XV, 9 que muitos seres professam a religiosidade mas tem o coração longe dele: "Em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos dos homens".» Mohini, um jurista e investigador espiritual, foi membro da Sociedade Teosófica de 1882 a 1887, tendo sido professor numa escola da Sociedade Teosófica e secretário do Coronel Olcott, viajou com ele e sua mulher Blavatsky até ao Reino Unido em 1884, em parte para defender Alfred P. Sinnet das controversias que as cartas dos Mahatamas que ele publicara, além do livro Budismo Esotérico, que da religião e filosofia budista pouco têm, tinham gerado entre os teósofos mais esclarecidos. Blavatsky considerava-o um discípulo directo dos mestres e Mohini clamou  também receber cartas dos famosos Mahatmas dos Himalaias. Contudo veio a sair da Sociedade Teosófica, no dizer de Blavatsky porque falhando como chela ou discípulo, ao ter-se desviado do caminho, atraído por teósofas. Quanto ao que ele não pensava e decidira, não sabemos bem mas há quem pense que preferiu seguir o seu caminho de poeta e escritor, livre. Um ser bem valioso de ser estudado pois, como brâmane e dominando a espiritualidade indiana, deixou boas obras, nomeadamente a tradução da Viveka Chudamani, e de algumas Upanishads, com George Herbert Mead, hoje pouco lembradas. Os dois místicos irlandeses William Butler Yeats e George William Russel admiraram-no muito, o Nobel de Literatura dedicou-lhe mesmo uma ode.
                                      
A ligação pelo oceano energético celestial entre o
planeta Terra e a Diana inspiradora é efectuada pela primeira vez em 1969 por nautas da tecnologia moderna, três astronautas norte-americanos, que beneficiarão de energias, vistas e sentimentos tão extraordinários e sublimes como os dos primeiros navegadores em paisagens e horizontes então desconhecidos, belos e puros, como podemos ver algo na Carta de Pero Vaz de Caminha, no achamento português do Brasil, em 1500. Edgar Mitchell será o que sentirá mais profundamente a expansão energética e consciencial vivida, entrando num certo tipo de caminho espiritual e de investigação psíquica, energética e de extra-terrestres. O cientista Wernher Von Braun, um dos  responsáveis do êxito da missão, dirá: «A maior contribuição dada até hoje por um povo para a história da civilização foi a dos Portugueses com as suas explorações e descobrimentos marítimos... Portugal deu novas terras ao mundo; nós, os cientistas do espaço, dar-lhe-emos novos planetas».
                                     
21-VII. Martim Afonso de Sousa morre em 1571 em Lisboa, com 71 anos de idade. Cavaleiro da Ordem de Cristo, discípulo do mestre cosmógrafo Pedro Nunes, um dos governadores mais destemidos e afortunados nas batalhas, primeiro do Brasil (1530 a 1533) onde exerceu a sua missão, ora colonizadora, ora libertadora dos corsários franceses com grande eficácia, e em seguida na Índia desde 1534, onde de tal forma se destacou que chegará a governador do Estado, de 1542 a 1545, deixando as armadas acreditadas e os cofres repletos, à custa é certo de alguma pirataria... Luís de Camões dirá: «Este será Martinho, que de Marte / O nome tem co’as obras derivado, / Tanto em armas ilustre em toda a parte, / quanto, em conselho, sábio e bem cuidado». As suas experiências foram partilhadas e aprofundadas com Pedro Nunes, que as esclareceu nos seus Tratados de Marear. O sábio Garcia de Orta, que foi seu médico pessoal, elogiou-o na dedicatória do seu Colóquio dos simples e drogas e coisas medicinais da Índia, Goa, 1553, e diz-se discípulo «da escola militar e cortesã» de Martim Afonso de Sousa, referenciando assim mais um Fiel do Amor.
                                          
O P. Adam Schall, presidente de Matemática, mandarim de 1ª classe pelos serviços prestado ao Celeste Império, regressa à Pátria Celestial em 1666, depois de sofrer nos últimos anos da sua vida perseguições e a prisão (livrou-se da morte por causa dum terramoto) e de ter legado dezenas de publicações valiosas. Sucedera ao P. Ricci como cientista na corte imperial e será substituído pelo padre belga Verbiest, e eis três dos pilares principais do relacionamento amistoso e curioso entre a China e  o Ocidente.
Nasce em Mirandela em 1844 neste dia 21, Luciano Cordeiro, que formado em Letras por Coimbra, se destacará como  redactor, professor, historiador, geógrafo e político colaborando em várias revistas e exercendo vários cargos. Animado por um grande amor à acção e presença portuguesa no mundo, foi um dos principais co-fundadores e dinamizadores da Sociedade de Geografia de Lisboa, em 10 de Novembro de 1875, que será uma instituição brilhante em fomentar o conhecimento do interior das terras ultramarinas, e em organizar eventos, dar apoios a expedições e trabalhos, fazer publicações e preservar  museologicamente, ao longo dos anos, ainda hoje estando viva. O seu Boletim, colaborado e assinado por insignes figuras, é uma fonte incalculável de informações valiosas. Em 1894, Luciano Cordeiro deu à luz a primeira impressão de um importante manuscrito, da Biblioteca da Academia das Ciências, do padre jesuíta António Cardim, Batalhas da Companhia de Jesus na Província do Japão, datada de 1642, lamentando na apresentação não ter tido tempo para apresentar uma edição crítica da obra, nem dar muitos dados biográficos de Cardim, que nascera em 1594 em Viana do Alentejo, sendo o pai Desembargador, e que deixara a Terra em 30 de Abril de 1659.
A Frente Unida dos Goeses, comandada por Francisco
Mascarenhas e apoiada pela polícia e o exército indiano, em 1954 recupera neste dia para a União Indiana os enclaves de Dadrá e de Nagar Aveli, até então na Administração Portuguesa, e ganha forças para prosseguir uma pequena guerrilha local.
Duarte Pacheco Pereira (1460-1533)
22-VII. Na armada de quatorze naus do capitão-mor Lopo Soares chega neste dia a Lisboa em 1505, vindo da Índia, Duarte Pacheco Pereira, e é acolhido por D. Manuel em procissão pelas suas vitórias sobre as tropas do samorim de Calecut e em defesa do rei de Cochim, do qual recebera, entre outras provas de grande amizade, armas heráldicas novas. Servirá ainda para lutar e prender um corsário francês, depois será nomeado general da armada do Estreito de Gibraltar e por fim, em 1519, governador de S. Jorge da Mina, donde virá em 1522 a ferros, acusado de sonegação de ouro, ficando preso algum tempo, até conseguir justificar-se, já porém com a alma bem desiludida das grandezas deste mundo e dos seus governantes. Talvez por isso o seu roteiro de viagens Esmeraldo de Situ Orbis, que D. Manuel lhe pediu para fazer, tão precioso para os pilotos, escrito em 1508, não foi finalizado. Uma das outras naus que fundeava em Lisboa era a do capitão Pedro Afonso Aguiar, depois de mais uma das suas missões no Oriente, na qual entregara a Trimumpura, rei de Cochim, aliado firme dos portugueses, presentes de ouro, prata, armas e roupas oferecidos por D. Manuel, combatendo ainda ao lado de Duarte Pacheco Pereira.

23-VII. A armada de D. Francisco de Almeida desembarca e conquista Quíloa em 1505, com muito pouca resistência. Nomeado outro rei, que fica amigo e vassalo, é erigida em poucos dias uma fortaleza dedicada a S. Tiago «tão forte que esperará nela a El-rei da França e tem aposentamento de muitas boas casas e bem abastecida... e todas estas obras se fizeram em dezassete dias, mas os fidalgos e daí para baixo, todos trazem os braços mais compridos da padiola.» Do que se passara mandou o seu secretário lavrar um auto, assinado por dez capitães e fidalgos para que os «ruins não furtem a verdade». Mesmo assim terá de responder ao rei mais tarde: «E assim me diz Vossa Alteza que houve prazer da tomada de Quíloa e Mombaça. Assim é de crer, pois a obra era vossa, mas eu não cuidava que me daria achaques pelo pouco que para vós se arrecadou», contestando de certo modo a ganância do rei e dos seus conselheiros. Tentando manter os oficiais acima do comércio, com ordenados razoáveis, recebeu do reino remoques e dirá: «Eu irei ao Reino, e apresentarei a El-Rei meu senhor o regimento que me deu, e se trespassei seus mandados dando sua fazenda, aí está a minha e se não abastar para pagar tanto dano, dir-lhe-ei que outra ora não meta a espada na mão do sandeu». Assim era o "homem que nunca mentia, nem fugia", segundo o relato do historiador João de Barros nas Décadas da Ásia.
                                          
Lokamanya Bal Gangadhar Tilak nasce em Ratnagiri, Maharasthra, em 1856. Formou-se em Matemática e em Direito, mas após uma curta experência de ser professor, como seu pai, passou para o jornalismo e para o activismo político, contra a opressão inglesa. O mestre Sri Aurobindo, que também foi seu discípulo na arena política, antes de se retirar para a demanda psíquica e espiritual, dirá acerca dele : «O verdadeiro tipo e incarnação do carácter, qualidades e espírito Maharatha, mas com a unificada solidez no carácter, o toque de génio nas qualidades, a força vital no espírito, que torna uma grande personalidade imediatamente no homem representativo do seu povo». Iniciando o redespertar do seu país, ligando a grandeza do passado com a do futuro, fundindo na política o fervor religioso e a espiritualidade, atravessando três aprisionamentos com equanimidade, Tilak será um dos pais da Índia independente. Deixou obras sobre o Árctico como local de origem dos rishis dos Vedas, e sobre Karma Yoga, a União através da acção desinteressada e o serviço.

                                      
24-VII. Em 1139, reza a história ou muito mais provavelmente a lenda, D. Afonso Henriques recebe a visita de um eremita da serra de Ossa a confirmar-lhe a protecção divina seja para a batalha seja para o reino nascente. Então, ao sair para o campo, terá visto no «céu para a parte do Oriente um resplendor fermosíssimo e no meio dele Jesus crucificado rodeado da milícia celeste». A referência mais antiga que existe é de 1485, quando Vasco de Lucena, na Oração de obediência ao papa Inocêncio VIII, narra a visão que D. Afonso teria tido ajoelhado em oração, conhecida como o milagre de Ourique, e que tem feito correr tanta tinta, sobretudo desde que Alexandre Herculano, um probo historiador, o pôs em causa. Associado a esta lenda surgiu a de que teria também aparecido o Arcanjo de Portugal e que este seria Mikael, esta uma evidente patranhice, ainda hoje propagada por alguns...
                                        
António Galvão chega a Lisboa da sua segunda missão no Oriente, na capitania da nau Santa Maria do Espinheiro, em 1527, onde se destacou pela sua grande sabedoria náutica, aconselhando o piloto de modo a evitar naufrágios. Em Cochim, sabendo que o P. Francisco Álvares trazia da Etiópia os restos mortais de seu pai Duarte Galvão, embaixador ao Preste João, levou-os às escondidas para a sua nau e trouxe-os para serem depositados na igreja de Xabregas. Ao longo de muitos anos ligado aos descobrimentos e navegações, soube escrever o seu Tratado dos Descobrimentos, ainda que registando fábulas de fontes antigas, valioso nas informações, corajosamente elogiando nele Damião de Goes pois «viu e correu a maior parte da Europa por sua livre vontade, coisa digna de louvor e memória, pois deu luz à sua pátria de muitas coisas ocultas a ela... Este e Fernão Coutinho foram em nosso tempo os mais nobres portugueses e os que mais províncias e terras viram por suas livres vontades, que é sinal de nobre pensamento. Quis aqui com os mais descobridores e navegadores que tenho apontado declarar». Inclui no seu Tratado os feitos de “nuestros hermanos” e dos outros descobridores europeus. O seu testamenteiro foi Francisco de Sousa Tavares um mestre de armas e do espírito, autor do magnífico Livro de Doctrina Espiritual. Certamente dois dos Fiéis do Amor, dos Cavaleiros Andantes a que se referiu o dramaturgo Jorge Ferreira deVasconcelos, inter pares...
                                              
P. Francisco Álvares, depois de seis anos na Etiópia, chega a Lisboa na nau capitaneada por António Galvão, neste dia 24 de Julho de 1527 com os sobreviventes da embaixada ao Presbyter Joanes e com o bispo embaixador deste, Saga Zab. Para imprimir a Verdadeira Informação das Terras do Preste João irá a Paris buscar o material tipográfico mais conveniente. Publicada em 1540, com a sua bela portada, em poucos anos estava traduzida em várias línguas europeias, tal era a atracção que o mito do misterioso rei cristão exercia na Europa renascentista. O P. Francisco Álvares, capelão de D. Manuel, era ainda um religioso aberto e mostrava a tolerância que depois a Contra-Reforma e a Inquisição abafaram. Perguntado pelos etíopes qual era a melhor missa, a romana ou a copta, «nós respondíamos que ambas eram boas visto que tendiam ao mesmo fim, e Deus se comprazia em ser servido de muitos modos diferentes». Mas ao bispo etíope o mesmo não sucederia em Lisboa e foi proibido de comungar, tido como herege e quase excomungado; só através dos opúsculos sobre a Etiópia, de Damião de Goes, logo proibidos, e numa ou outra obra de religiosos ou filósofos, tal a Física do Dr. Pedro Margalho (que fôra um dos que discutira com Saga Zab), é que sabemos das particularidades e diferenças algo silenciadas, pelo judaísmo, islamismo e nestorianismo que significavam ou continham. Diogo de Couto, sempre mais ousado e crítico, escreve nas suas Décadas: «Um judeu douto nos disse nesta cidade de Goa, que aqueles judeus, e outros que andavam espalhados pela Abasia e pela Núbia, eram de alguma daquelas tribos que andam desaparecidas». O notável historiador e cavaleiro do Amor Manuel de Faria e Sousa, na sua monumental obra Ásia Portuguesa, apontará em idêntica direcção: «Apesar de aceitarem esta Lei (cristã), não desamparam aquela (a israelita), e juntamente usam as duas, assim como agora fazem os cristãos-novos na nossa Europa».
                                          
Na noite de 1587, o Taiko Hideyoshi, sucessor de Nobunaga no governo militar nipónico, ou Regente Imperial, pergunta, depois de terem bebido um pouco mais de sake, ao missionário P. Gaspar Coelho: «porque induzem eles os seus discípulos e sectários a destruírem os templos? Porque é que eles comem animais úteis ao homem como os bois e as vacas? Porque compram homens para os fazerem escravos?» No dia seguinte publica o édito de expulsão dos missionários, que continuarão ainda assim no Japão, mas contando com o avolumar de dificuldades e quem sabe o fim de uma saga unilateral de encontro entre o Ocidente e o Extremo-Oriente, com as suas fortes e sábias tradições e religiões...
Raimundo Farias Brito nasce no Ceará, neste 24.VII. 1862. Formado em Direito no Recife, será um dos filósofos brasileiros que procurará descobrir e explicar os mistérios mais profundos da vida. Uma das suas frases mântricas mais famosa e desafiante é esta: "Há pois a luz, há a natureza e há a consciência.// A natureza é Deus representado, a luz é Deus em sua essência e a consciência é Deus percebido", desafiando-nos a tentarmos sentir e ver a luz interior como a essência de Deus, de tal modo se transmitindo ou revelando. Quanto à última frase: "a consciência é Deus percebido", desafia-nos a entramos mais na essência de consciência, a qual é divina. Certamente que a Divindade percebendo-se é a auto-consciência primordial e cada um de nós percebendo-se é consciência, auto-consciência. Juntarmos, abrirmos ou aprofundarmos a nossa consciência pessoal, a da personalidade, à espiritual e divina, mais íntima e subtil, eis a tarefa, meditativa e da vida.
25-VII. Em 1109 nasce em Guimarães, filho do Conde D. Henrique e de D. Teresa, o fundador do reino de Portugal D. Afonso Henriques. E em 1139 vence em Campo de Ourique (lisboeta ou alentejano, não se sabe ainda bem) alguns sheiks árabes e teria sido aclamado rei de Portugal, neste dia de Santiago, um dos nomes (tal como S. Jorge) exclamados como mantra ou palavra invocatória e evocatória de poder nas lutas em que os portugueses se envolviam então constantemente. Fernando Pessoa invocou-o muito bem na Mensagem, e sem dúvida continua a ser um dos numes, manes e mestres da Tradição Espiritual Portuguesa, nomeadamente para quem a medita com mais profundidade.
                                           
O jesuíta italiano P. Rodolfo Aquaviva
(1500-1583), que participara nos diálogos na corte do imperador mogol Akbar, é martirizado com nove companheiros em 1583, em Cuncolim, Salsete, por indianos revoltados contra a intolerância religiosa que lhes profanara e arrasara uma série de templos, terminando assim a sua carreira para tristeza de Akbar, que o não queria deixar sair da sua corte universal em Agra, onde durante três anos vivera como um eremita, jejuando, orando, aprendendo persa com Abu’l Fazl e ensinando-lhe certos aspectos do Cristianismo, e convivendo com uns poucos. O imperador mogol Akbar, na carta que enviara à despedida para o Provincial dos jesuítas em Goa, diz: «Uma vez que gosto muito do livro do Jesus Celestial, e desejo descobrir a verdade dele e com a ajuda da habilidade do P. Aquaviva descobrir os significados dos que escreveram antes, tenho muito amor pelo padre; e considerando como ele é sábio e conhecedor das leis, desejo tê-lo a conversar comigo a todas as horas». Ao partir, o P. Aquaviva não aceitou jóias, mas levou uma família russa e uns poucos de cristãos, pois embora tivesse sido boa a convivência, já não acreditava na conversão para a qual tanto orara e lutara. Depois de alguma repressão sobre os habitantes da zona de Cuncolim, uma gradual conversão operou-se. Em 1893, os cinco mártires jesuítas, Rodolfo Aquaviva, Afonso Pacheco, Pedro Berno, António Francisco e Francisco Aranha foram solenemente beatificados pela Santa Sé.
 

Chega à barra do Tejo, neste dia em 1572, envolto na aura dos heróis (e fora um dos que foram armados cavaleiros na Igreja de Santa Catarina no monte de Sinai por D. Estêvão da Gama), D. Luís de Ataíde (1516-1581), vice-rei do Estado Português na Índia de 1568 a 1571. Embora cantado em poema pelo sábio humanista André de Resende, talvez por criticar a ideia da funesta campanha de Alcácer Kibir será de novo enviado para a Índia como vice-rei, que execerá muito bem de 1578 a 1581, 10 de Abril, em Goa, pouco depois de saber das trágedias que enlutavam e desmonoravam Portugal. Os restos do seu corpo tão viajado e abnegado repousa hoje em Peniche, na Igreja da Misericórdia.
Nasce Masaharu Anesaki neste dia em 1873 e viverá até 1949, como escritor e professor, tendo estudado e convivido na Europa com mestres como Oldemberg, Paul Deussen, Albrecht Weber, Thomas William Rhys Davids, este um dos grandes especialistas de pali e do Budismo, a via religiosa que Masaharu privilegiou, embora as suas obras abrangessem a vida e cultura japonesa em geral.
Dr. Devasenapati, professor de filosofia da Universidade de Madrasta, nasce a 25.VII.1914. Dirá: «Tenho uma profunda dívida de gratidão para com as outras religiões, especialmente o cristianismo. Eu posso ser um tipo de hindu, mas verdadeiramente um tipo melhor do que se não tivesse aprendido nada das outras religiões. As fés dos outros homens têm sido um desafio e uma inspiração para mim». «O crescimento do estado de selvajaria para o de santidade (como diz Arnold Toynbee) parece-me ser o sentido da história. Um santo é uma pessoa completamente redimida do seu auto-centrismo, que pelos seus pensamentos, palavras e actos, e sem dúvida pela sua mera presença, ajuda os outros a vencerem o seu egoísmo... O serviço humano não está confinado só ao humano. Tudo o que é vivo está em provação para promoção a um nível superior de vida».
                                        
26-VII. Nasce em Kesswill, na Suíça, o psicólogo Carl Gustav Yung em 1875 que aprofundou muito mais que o seu professor Freud os mistérios do psiquismo humano. Publicou com Richard Wilhelm um valioso estudo sobre o Livro das Mutações chinês, o I Ching. Virá a considerar o «inconsciente como uma disposição psicológica colectiva tendo um carácter criador». Reconhecendo no «Yoga um método perfeito e apropriado para fundir o corpo e o espírito numa unidade... e que esta realização espiritual do Oriente constitui uma das maiores coisas que o espírito humano já produziu», pôs dois obstáculos à sua utilização no Ocidente: a civilização ocidental com apenas mil anos, é mais bárbara que a oriental e por isso o inconsciente não pode ser facilmente suprimido ou controlado, antes de ser muito bem conhecido, e por outro lado isso pode ser um sobrecarregar do inconsciente, que se quer libertar do domínio estreito da consciência. Dirá ainda, numa linha do que Antero de Quental também profetizara«No decorrer dos séculos, o Ocidente produzirá o seu próprio Yoga, que será erigido sobre as bases do cristianismo», algo que contudo não se conseguiu tanto, pesem contudo algumas tentativas e frutificações como as do Padre Bede Griffiths (1906-1993) no Satchitananda, Tiruchi, Índia, ashram onde eu estive um mês.
O oftalmogista goês Gama Pinto morre neste dia 26 em 1945
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Fino espírito, belo representante dos luso-indianos, comentou numa carta as festas de Goa: «Achei graça ao Padre, que na força do seu entusiasmo, desatou a dar Vivas a Nossa Senhora e ao Coração de Jesus, como se quem está no gozo da vida e bem-aventuranças eternas pudesse ter um acréscimo desse gozo em quantidade ou qualidade». Mas, no seu caso, ou nas pessoas comuns, serão úteis ou não orações e irradiações feitas para elas em intenção superior e com fé e ardor? A ideia cada vez mais aceite do Campo Unificado de energia-informação facilita tal hipótese...

27-VII. A invencível armada do ambicioso rei D. Filipe II («E o lúgubre rei sorri, ao ver agrupados em 400 navios, 80.000 espadas», diz-nos Victor Hugo), enviada contra os «herejes dos ingleses», para destruir a pirataria e conseguir o domínio da Europa, é vencida pelos elementos em fúria em frente a Calais e depois pelos ingleses comandados por Drake, em 1588. As repercussões no apoio ao Oriente serão grandes pois das 146 embarcações que partiram só 53 regressam. Victor Hugo elogia a participação portuguesa: «A Alemanha deu as suas temíveis urcas, / Nápoles os seus brigantins, Cádis os seus galeões, / Lisboa os seus marinheiros, - pois é preciso leões». Os sobreviventes na costa irlandesa serão todos mortos, mas os na Escócia serão humanamente acolhidos. O P. Ribadeneyra, que exortara triunfante à cruzada, tentará agora sugerir ao rei em carta adoçada «as grandes causas porque Deus enviara este trabalho».
Nasce neste dia em 1837, em Lisboa,  Santos-o-Velho, o notável botânico, e um dos fundadores do Jardim Botânico de Lisboa e, por essa paixão orientalista, Francisco Manuel de Melo Breyner, o 4º Conde de Ficalho, que foi também um conselheiro político e embaixador, nomeadamente à coroação do Tzar Nicolau II da Rússia, em 1896,   muito apreciado. As suas obras sobre a Flora indiana, Garcia de Orta, Pero da Covilhã e Camões, destacam-se, mas deixou ainda contos que espelham a sua sensibilidade e amor da natureza, tal como os contidos em Uma Eleição Perdida, 1888. Viveu apenas 65 anos.

28-VII. Em 1590 os quatro legados dos dáimios de Kiushi desembarcam finalmente no Japão carregados de presentes e experiências do seu périplo de união do Oriente e Ocidente de seis anos. Chegara a haver 50 dáimios (príncipes) cristãos, mas o governador militar do Japão Toyotomi Hideyoshi em 1587 decreta a expulsão dos missionários, dando-lhes vinte dias para deixarem o Japão: Em 1591 escreverá ao vice-rei em Goa a explicar a medida: «E os padres vieram estes anos atrás a estes reinos a ensinar outra lei para salvar os homens; mas por quanto nós outros estamos já assentados nestas leis dos Camis (Espíritos) não temos para que desejar de novo outras leis; porque mudando a gente várias opiniões e leis, é coisa prejudicial para o reino; e por esta causa tenho mandado que os padres se vão do Japão, e proibido que se promulgue esta lei, e que nenhuma pessoa venha aqui adiante pregar novas leis nesta terra». Os quatro jovens embaixadores, acompanhados do prudente P. Valignano, virão a ser bem recebidos por Hideyoshi, que desejava e mantinha ainda as relações comerciais mas não a «religião diabólica», que tanto perturbava as estruturas sócio-económicas como as doutrinas religiosas e que já tinham causado a destruição de santuários shintoístas e templos budistas. Recentemente, sob coordenação do sábio  da Universidade de Coimbra Sebastião Pinho foram traduzidas e publicadas várias obras relativas a esta viagem e encontro. E
29-VII. Institui-se a Companhia do Negócio da Índia em 1694, no vice-reinado de D. Pedro Menezes Noronha de Albuquerque (1692-1697), quando as armas, a diplomacia (sobretudo com a Pérsia) e o comércio tentavam evitar a decadência acelerada do domínio português no Oriente. A armada de Sambaji é então derrotada em Rajapur, mas os ataques dos maratas, dos árabes, dos holandeses continuam e o pequeno número de portugueses é manifestamente insuficiente para manter o pouco que já restava das antigas possessões. Mombaça cairá em 1698 tomada pelos árabes de Omã, após dois anos de lutas encarniçadas. Na Índia só resta a zona de Goa, Damão e Diu, Chaul e Baçaim e a feitoria que os mogóis permitiam ainda em Surate. Embora os descendentes de portugueses fossem muito mais que os portugueses na Índia, a utopia inicial duma civilização indo-portuguesa esboroava-se, em sincronia com os grandes monumentos de Velha Goa abandonada. A hostilidade islâmica e protestante, a pirataria e a brutalidade dalguns portugueses, aliadas a uma incapacidade organizativa, em que a comiseração nos objectivos e a suficiência e a temperança nos meios não foram realizados, geravam as consequências.

30-VII. O P. Francisco Álvares, regressado da embaixada de seis anos ao Preste João, tendo recebido um benefício no arcebispado de Braga, chega a esta cidade em 1529: «sendo eu com sua senhoria (o arcebispo D. Diogo de Sousa) jamais cessava de me perguntar por coisas do Preste João. Eu lhe respondia na verdade como o eu muito bem sabia e Sua Senhoria tudo mandava escrever e as perguntas e respostas são as seguintes:... Toda a gente que vem à igreja há-de comungar cada dia ou não vir à igreja. E acabada a comunhão lhes dão uma pouca de água benta com que lavam a boca... Há aí muito manjericão pelos matos e não há árvore dos nossos senão ciprestes, ameixieiras e salgueiros, pelas ribeiras, não há aí melões, pepinos, nem rábanos... Há aí muitos gafos nesta terra e não vivem apartados da gente e vivem todos juntos. Há aí muitas pessoas que por sua devoção os lavam e curam suas chagas com suas mãos... Há aí muita quantidade de mel em toda a terra e as colmeias não estão em colmeal, mas estão dentro nas casas onde vivem os lavradores... Posto que nas igrejas haja imagens pintadas em todas paredes e assim cruzes, porém em nenhuma cruz está crucifixo pintado, nem não há aí de vulto, porque dizem que não são merecedores de ver Cristo crucificado... E todo o clérigo ou frade traz um corninho de cobre com água benta e os hóspedes onde chegam lhes pedem água e bênção e eles lha dão. E antes que comam lançam gotas de água no comer, assim nas vasilhas de beber». Estas perguntas e respostas tornaram-se o último capítulo da Verdadeira Informação das Terras do Preste João das Índias, mas mesmo assim não revelavam as diferenças maiores que o cristianismo do Preste João tinha para com o de Roma, só reveladas com a vinda a Lisboa do embaixador e bispo Saga Zab  e com a pena arguta de Damião de Goes relatando as discussões, e que foi logo aparada pela Inquisição.
                                      
 31.VII. D. Juliana Dias da Costa, nascida em Agra, filha de Agostinho Costa, um dos prisioneiros de Hugli, que veio a ser o médico do príncipe Bahadur, tornou-se a médica e educadora dos filhos e filhas do imperador mogol Aurangzeb, entre os quais Bahadur Shah, a quem sempre foi fiel. Quando este subiu ao trono (em 1707), recebeu recompensas e o privilégio de coroar imperadores, sendo presenteada ainda com a casa que fora do príncipe Dara Shikoh, o sábio irmão mais velho de Aurangzeb e por este morto na luta pela sucessão. Foi a grande protectora dos cristãos e ocidentais, até morrer neste dia em 1734. O P. Desideri, autor da Relação sobre o Tibete, chama-a "suporte e ornamento da nossa santa Fé no Império". O imperador Bahadur Shah, que a consultava constantemente, dizia que se ela fosse homem escolhia-a para vizir e chamava-lhe Mãe e Fidavi Duago, Dedicada à Oração. Na corte do mogóis, como na de outros reinos da Índia, houve frequentemente portugueses e europeus, contribuindo com os seus dotes numa universalidade civilizacional também significativa da hospitalidade indiana. O raja Jai Singh Sawai, de Jaipur, o criador dos observatórios astronómicos famosos de Delhi e Jaipur, acolhera na sua corte o Padre Figueiredo e o médico Pedro da Silva, tendo recebido do primeiro importantes livros astronómicos. D. Juliana Dias da Costa, nos seus últimos anos de vida, pediu que a deixassem recolher-se ao convento das Mónicas em Velha Goa, mas nem a corte mogol, nem o vice-rei e os padres portugueses autorizaram, mostrando-lhe quão valioso era o mérito do seu serviço, reconhecido mesmo pela companhia Holandesa das Índias Orientais.
O Rei D. João V morre neste dia 31 em 1750, após 43 anos de reinar com bastante diplomacia, fortuna económica e obras públicas e amor à Igreja e às freiras. A relação oficial do mesmo ano a Vida, sucessos e falessimento do Rey Fidelissimo D. João V, escrita pouco após a sua morte, descreve bastante arrogante e militarmente o seu reinado na Índia: «No Estado da Índia infundio o seu império naqueles bárbaros profundos respeitos, destruindo as suas armas os Reis de Canara e Sunda, vencidos numa batalha naval. No ano de 1717 reduziu a cinzas a cidade de Porpatane o general D. Lopo de Almeida. No de 1719 alcançou uma completa vitória dos Arabios o Almirante António de Figueiredo Utra. No de 1726 sujeitou o Vice Rei João de D.Saldanha ao orgulhoso Régulo Sar-Dessai de Cudale, obrigando-o a pedir a paz, depois de abrazar-lhe as aldeias de Peligão, e de Maien; adiantando este mesmo vice-rei estas vitórias, ganhando Bicholin depois de seis dias de sítio./ Constando-lhe que com furiosa guerra invadia o Marata a todo o Norte, até encher de sustos a Goa, levado do zelo da Religião, que se via profanada naquela Cristandade, mandou por Vice-Rei daquele Estado ao Conde da Ericeira D. Luiz de Menezes com uma numerosa esquadra: o mesmo importante socorro acompnahou a Pedro de Mascarenhas, que lhe sucedeu no Governo; até que ultimamente governando aquele Estado o Marquês de Castelo-Novo, alcançou dos Bonsulós tantas vitórias, como constão de vários manifestos, rendendo todas aquelas praças, que nos governos passados desde a aclamação del-Rei Dom João IV tinhamos perdido naquele Estado; fazendo gloriosa a sua memória, e não menos imortal o seu nome nos Portugueses Fastos; remetendo-lhe El Rey importantissimos socorros para seguir os seus triunfos, e dando-lhe em prémio dos seus distintos merecimentos o título de Marquês de Alorna, uma das praças conquistadas pelo seu valor, que tem posto em reverente consternação todo aquele vastíssimo continente». Assim terminava, muito exagerando nos efeitos no vastíssimo subcontinente...
                                       
 Nasce em Viareggio, a 31 de Julho de 1887, Mario Vallauri. Estudou língua e literatura sânscrita com Michele Kerbaker, Pavolini e Jules Jolly, tornando-se professor emérito de sânscrito na Universidade de Turim de 1922 a 1957. Deixou uma vasta obra de estudos indianos, nomeadamente acerca da medicina, das Puranas (histórias e epopeias semi-míticas) e do conceito de Avatara, a manifestação ou descida da Divindade num ser, tão particularmente desenvolvida na Índia, onde ainda hoje se chama demasiado facilmente avatar a gurus que são apenas mais populares ou mitificáveis como tal...
14º Dalai Lama e Jean Marquè-Rivière.
 Jean Marquès-Rivière nasce neste dia 31 de Julho em 1903 em Paris e viverá 97 anos de grandes investigações, escritas, aventuras, perseguições. Estudou sânscrito e tibetano na Sorbonne, com Jacques Bacot, e entrou nos meios ocultistas, teosofistas, maçónicos (na Grande Loje de França), tântricos e tradicionalistas, nesta linha publicando na Voile d'Isis, de René Guénon, seu amigo, vários artigos. Todavia em 1931 tem a sua iluminação anti-macónica e anti-mágica, e passa a denunciar os perigos dessas vias. Entra assim no Catolicismo Romano, mas continua a pesquisar o Oriente, viajando até à China (e virá a escrever sobre o I Ching) e publicando vários livros, sobretudo a partir de 1936-37 quando esteve um ano na Índia: L'Inde secrète et sa magie, Le Yoga tantrique hindou et tibétain, Rituel de magie tantrique hindoue. Em 1940 faz sair a sua Histoire des doctrines ésotériques, pela qual recebe mesmo um prémio da Academia Francesa. Os seus ataques aos maçónicos e judeus, a sua adesão ao nacional socialismo e ao governo de Vichy, onde desempenha cargos de censura e em exposições e filmes (Forces Occultes, 1943, com Maurice Remy), vão-lhe criar problemas, chegando mesmo a ser condenado à morte, e acabando refugiar-se em Madrid, sob a protecção de Franco, onde recebe uma cátedra de professor de Orientalismo. Foi membro da Sociedade Asiática e dialogou com o Dalai Lama. L'Inde secrète et sa magie contém páginas muito valiosas dos seus encontros e compreensões.