sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Luís da Silva Leitão, um naturista e tolstoiano de Elvas, 1866-1940). Tolstoi e o pacifismo em Portugal.

Luís Leitão, um notável tolstoiano da Tradição espiritual portuguesa.
 
Luís Albino da Silva Leitão nasceu em Elvas a 18 de Março de 1866 e veio a desencarnar, após uma ingente actividade como jornalista, escritor, tradutor, pedagogo, naturista e activista, em Lisboa, a 13 de Maio de 1940. Chegou a dirigir a Revista do Bem e foi inegavelmente um activo defensor dos Direitos Humanos, das Mulheres, dos Animais e das Árvores, destacando-se como um dos dinamizadores da Festa da Árvore em Portugal e da Semana da Bondade
Casou-se com a luminosa Maria Pacheco Leitão, a qual veio a publicar o In-Memoriam do seu marido, intitulado muito significativamente Um Evangelizador da Bondade e da Beleza, com colaboração de Alice Moderno, Ulysses Machado, Fontana Silveira, Maria Evelina de Sousa, Rodrigo Velloso, etc. 
Pertenceu a numerosas agremiações e sociedades nacionais e estrangeiras, como se pode ver hoje em dia na sua biografia na Wikipédia, que me auxiliou nesta introdução às páginas consagradas a Tolstoi e fotografadas do seu livro À Sombra das Boas Árvores, o qual, neste último 30 de Novembro, de 2015, me foi mostrado pelo João Paulo, director da livraria Ferin (que editara a obra em 1916), no fim da sessão de homenagem aos 80 anos da entrada de Fernando Pessoa nos mundos espirituais, promovida pela Associação Portuguesa dos Escritores, com intervenções valiosas de Fernando J. B. Martinho, Rita Patrício e António Durães. 
                                   
Vegetariano entusiasta, tendo privado bastante com o pioneiro Amílcar de Sousa, que o elogiou como ser íntegro a todos os níveis, Luís Leitão escreveu: "Considerada em absoluto, a alimentação animal é nociva debaixo de todos os pontos de vista. Mas sob o ponto de vista moral? Principalmente sob esse, e tanto assim que Toltoi afirma ser indispensável a todo o homem que procura aperfeiçoar-se moralmente, privar-se de semelhante espécie de alimento. […] Acreditamos na sinceridade e boa fé das pessoas que afirmam ser natural a ingestão de carne, mas nada impede que essas pessoas se enganem conjecturando assim. Pensamos que se é rigorosamente imoral, como de facto é para os espíritos meticulosos, o homem valer-se da inferioridade relativa de outros homens para os arvorar em seus criados, impondo-lhes obrigações vexatórias, bem mais imoral é comer os nossos semelhantes de quatro e duas patas, simplesmente porque eles não podem opor-se a tal violência, e porque nos aprouve classificar de agradável a sua carne. Não, mil vezes não! A natureza obriga-nos a comer, é certo, mas deu-nos na exuberantíssima vegetação da terra elementos de sobra para satisfazer tal exigência." 
Segue-se  o capítulo consagrado a Tolstoi, no qual Luís Leitão se revela um admirador entusiasta da sinceridade de vida do escritor russo, embora afirmando que não concorda em absoluto com tudo o que ele diz. Que reticências terá tido é uma boa questão (o seu radicalismo anti-sexual?) que talvez noutros escritos se possa desvendar, pois neste a admiração, justificada, é grande e brilhantemente transmitida....
De qualquer modo, e a partir da leitura da última obra de Tolstoi sobre a guerra da Rússia e do Japão, Luís Leitão descreve e enaltece com sensibilidade e claridades dois aspectos fundamentais de Tolstoi: o seu pacifismo e a condenação das ambições, grandezas e guerras, mensagem esta sempre actual pois é constantemente atacada e destruída pelas criações de terroristas, e posterior bombardeamentos deles, como temos observado com os Estados Unidos da América e a Arábia Saudita a criarem grupos terroristas que são depois apoiados por Turcos, Ingleses, Franceses, NATO, Israel, etc., até que, escapando-lhes do poder e virando-se não já só para os adversários para que os criaram, os começam a bombardear, mantendo assim a indústria dos armamentos e a insensibilidade ao mal da guerra na moda ou na mó de cima, para o que contribui muito a mediatização manipuladora de tudo, e em especial dos atentados e violências e pelas reacções que eles podem suscitar e permitir de explorações e opressões. 
Contra esta hipocrisia do Ocidente certamente se revoltaria Tolstoi, e aqui fica algo da indignação dele por via de transmissões, das quais certamente Jaime de Magalhães Lima e Luís Leitão são elos. 
Os outros aspectos referidos com intensidade por Luís Leitão são a condenação da caça e da morte dos animais e em seguida a imensa bondade, compaixão e capacidade de sentir, acolher e tentar vencer o sofrimento dos outros que Tolstoi manifestava e que à sua medida Luís Leitão e a sua mulher também inquebrantavelmente realizaram. 
Escreve mesmo, como poderão ler em seguida: «Depois de Jesus não conhecemos espírito aberto com mais amor e carinho aos sofrimentos alheios, respeito maior à dor, consideração mais completa pelo sofrimento dos "outros"» 
De realçar os colchetes que ele pôs à volta dos "outros" provavelmente querendo dizer que também os somos ou que a unidade da vida e do género humano é bem maior do que egoicamente queremos crer...
Leiamos então as páginas tolstoianas....








Como vemos as palavras, ideias e sentimentos que se evolam deste texto, que brevemente fará 100 anos, são ainda hoje muito actuais, ou mesmo mais actuais, já que o artificialismo e o laxismo das vidas citadinas se tem acentuado, embora o vegetarianismo e o veganismo tenham justificadamente crescido...
Luís Leitão, tal como Tolstoi, acreditava na utopia dos seres a viverem mais em contacto com a natureza, contemplando o nascer do Sol, com uma alimentação natural, biológica e vegetariana, um trabalho que satisfaça interiormente e numa sociedade pacifista e educada por princípios de amor, solidariedade e espiritualidade e nestes sentidos, tão altruisticamente vividos, ele é certamente um dos elos da Tradição Espiritual Portuguesa, sendo por isso aqui, com sua mulher e companheira anímica, saudado e invocado muito luminosamente.

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