quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Tolstoi. Biografia e um texto seu em vídeo, e pensamentos luminosos e actuais, no seu dia de anos, 9/9/1828

Pensamentos-sementes do génio russo Tolstoi (1828-1910), nas comemorações do seu aniversário em 9 de Setembro de 2104, seguido de dois vídeos gravados neste mesmo dia, o primeiro uma pequena e simples biografia, o segundo a leitura comentada de um dos seus últimos textos, Apelo à Juventude, os quais se encontram no fim desta antologia...
Excerto Da Anexação da Bósnia e da Herzegovina pela Áustria,  Versão portuguesa de Jaime de Magalhães Lima. 1908.
"Estamos tão acostumados a pensar que alguns homens devem governar a vida dos outros que as leis emanadas de alguns deles, mandando aos outros crer ou proceder de certo modo, não nos parecem estranhas. Se os homens podem publicar tais decretos e obedecer-Ihes é porque não reconhecem nas pessoas aqui...lo que é a verdadeira essência de todo o ser humano – a Divindade da sua alma, sempre livre e incapaz de se submeter a qualquer coisa que não seja a sua própria lei, isto é, à consciência e à lei de Deus...”
"O patriotismo, para todo o membro de um grande Estado e para mim, um russo, não somente envolve a ausência de simpatia com milhares e milhões de homens, polacos, fínios, judeus, e várias tribos caucásicas, mas também resulta em que eu seja o objecto do ódio dos homens, aos quais não fiz mal algum e com os quais nenhum contacto tenho. Para as pequenas raças ou nações escravizadas é ainda pior: pelo lado espiritual é a causa justificativa do ódio a um povo que lhes é estranho, e pelo lado material produz toda uma série de opressões, perdas e sofrimentos; e este sentimento obsoleto, grosseiro, e moral e materialmente pernicioso é advogado e insinuado por todos os meios, da parte daqueles a quem aproveita, e é ingenuamente aceite como virtude e bênção por aqueles aos quais é manifestamente nocivo"...
"Os povos devem ter consciência da sua dignidade humana, igual para todos, incompatível com o domínio de alguns sobre a vida dos outros, ou com a sujeição desses outros a qualquer. Esta consciência é unicamente possível para os homens que conhecem o seu destino na vida e seguem na conduta a direcção que deriva daquele conhecimento. E só conhecem o seu destino na vida e seguem na conduta a direcção que daí deriva, aqueles que tem religião (ou religação), ou que estão a nascer de novo permanentemente para o amor e o bem... 
"Hoje ainda vivo; amanhã, provavelmente, já não existirei, mas terei partido, para sempre, para o lugar donde vim. Enquanto vivo, se estiver em relações de amor com os homens, será isso para mim a alegria, a paz e o bem...
 
 "Para um ser humano que acordou para a compreensão religiosa ou espiritual da vida, o que se chama a autoridade do governo consiste meramente na atribuição, que a si mesmo fazem certos homens, de uma importância imaginária, que carece de qualquer justificação racional, mantendo a sua vontade por meio de violência. Para o homem acordado, esta gente desvairada e, em regra, venal, que coage os outros, é como salteadores de estrada que prendem os viajantes e os violentam. A iniquidade desta violência, as suas dimensões e organização, não pode alterar-lhe o carácter essencial. Para o homem que despertou, aquilo que se chama o governo não existe, e não há por conseguinte justificação alguma da violência cometida em nome do Estado, e não pode ter parte nisso. A violência dos governos será abolida, não por meios externos mas unicamente pela consciência dos homens que despertaram para a verdade."
"A relação com a fé era que a maioria dos seres humanos, não reconhecendo em si qualquer autoridade espiritual independente guiadora, cegamente se submetia à direcção de uma minoria escolhida, juntamente na compreensão da vida e na direcção das suas acções, enquanto a minoria, atribuindo-se qualidades supernaturais, considerou-se com o direito a guiar conjuntamente a vida espiritual e a corpórea da maioria.
A consciência de que a velha lei esta antiquada, gasta e que levou-nos à maior miséria e anormalidade de vida, e de que a nova lei de liberdade e amor revelada há dois mil anos exige aplicação e realização, tomou-se agora tão íntima dos seres humanos, não só no nosso mundo cristão mas em todo mundo, que um despertar da escravidão e da perversão, nos quais a si mesmo se vê mantido há tantos séculos, pode, julgo eu, surgir de repente. Porque na verdade, este acontecimento iminente, imensamente importante como é, depende não de quaisquer acções externas, que podem encontrar obstáculos invencíveis, mas inteiramente da consciência dos homens - que é sempre livre e nunca pode ser estorvada. De nenhumas façanhas ou acções difíceis em conflito com os inimigos mais fortes carece agora o povo do mundo inteiro para a sua emancipação, mas só de uma coisa, a coisa mais natural e normal ao homem - nem mesmo um acto, mas meramente uma abstenção - não fazer coisas contrárias à nossa convicção. E nem a convicção nem a abstenção de acções contrárias à convicção de cada um podem ser impedidas"
"O homem pode libertar-se imediatamente de toda a posição difícil, se apenas se lembrar de que Deus vive dentro dele. Deixai apenas que os homens concebam clara e firmemente o que eles são: deixai-os conceber o que foi ensinado por todos os sábios do mundo e o que foi ensinado por Cristo: que em cada homem, - como em todos, - habita o espírito livre eterno, todo-poderoso de um filho de Deus; que o homem não pode governar nem estar sujeito, e que a manifestação desse espírito é Amor. Deixai que os homens concebam isto (e já estão preparados para o reconhecer) e deixai só que eles procedam em harmonia - ou antes, deixai que eles somente não procedam em contrário da sua consciência, e imediatamente, da maneira mais simples e pacífica, todas as dificuldades se dissiparão...
"O mal não pode ser suprimido pela força física do governo. O progresso moral da humanidade não é provocado só pelo reconhecimento individual da verdade mas também através do estabelecimento da opinião pública…"

«Os seres humanos só podem submeter-se àquela lei suprema do Amor que dá o maior bem estar a cada indivíduo e a toda a humanidade. Só o reconhecimento, da parte dos seres humanos, do supremo princípio espiritual que neles está, e o reconhecimento consequente da sua verdadeira dignidade humana, pode libertar e libertará da servidão de uns aos outros. Esta consciência vive já no género humano, e está pronta a manifestar-se em todo o momento... 
Da Anexação da Bosnia e da Herzegovina pela Áustria, 1908.

Conversas com Teneromo: «O maior pecado ou erro de hoje é o amor abstracto dos homens, o amor impessoal para aqueles que estão em qualquer parte, ao longe... 
Amar as pessoas que não conhecemos, que nunca reencontraremos, é tão fácil! Não temos necessidade de sacrificar o que quer que seja. E ao mesmo tempo, está-se contente consigo próprio! Mas a consciência está limitada ou esmagada. - Não. É preciso amar o próximo, aquele com quem vivemos, ou o que nos incomoda...»

Excerto do livro Fim de um Mundo, 1905.
“Nestes últimos tempos, a deformação do Cristianismo deu lugar a um nova mentira, que mais mergulhou os povos na sua servidão. Com a ajuda de um sistema complexo de eleições parlamentares, foi-lhes sugerido que, ao elegerem os seus representantes directamente, eles participam no governo, e que, obedecendo-lhes, obedecem à sua própria vontade, pelo que são livres. Tal é uma mentira. O povo não pode exprimir a sua vontade, mesmo com o sufrágio universal: primeiro, porque uma tal vontade colectiva de uma nação de muitos milhões de habitantes não pode existir; segundo, porque mesmo que ela existisse, a maioria das vozes não seria a sua expressão. E não insisto no facto que os políticos eleitos legislam e administram, não para o bem general, mas para se manterem no poder, - e mesmo sem considerarmos o facto da depravação do povo devido à pressão e à corrupção eleitoral, - esta mentira é particularmente funesta, por causa da escravidão presunçosa onde tombam os que se submetem... 
Estes homens livres lembram os prisioneiros que se imaginam desfrutar da liberdade, ao terem o direito de eleger dos seus carcereiros os encarregados da polícia interior da prisão..."

Na Guerra e Revolução, Tolstoi, critica talvez exageradamente a ciência moderna e «os seus fúteis problemas: origem das espécies, análise espectral, natureza do rádio, teoria dos números, fósseis de animais e outras maluquices, às quais se atribui a mesma importância que se atribuía, na Idade Média, à Imaculada Concepção ou à dupla natureza substancial Divina.» 
«Estes servidores da ciência, tal como os que servem a Igreja, persuadem-se e persuadem os outros que salvam a humanidade, e, do mesmo modo que a Igreja, acreditam na sua infalibilidade, nunca estão de acordo entre eles, dividem-se em capelas, e , tal como a Igreja, são a causa principal da grosseria, da ignorância moral, do atraso nos homens em libertarem-se dos males que sofrem, já que eles rejeitaram a única coisa que podia unir a humanidade: - a consciência religiosa...»

Da Carta ao Mahatma Gandhi, dois grandes seres que muito se admiraram e apoiaram no Amor e Não-Violência, escrita dois meses antes de deixar a Terra:
"Quanto mais vivo - e sobretudo presentemente, quando sinto com clareza a aproximação da morte – mais forte é a necessidade de me expressar acerca do que me toca mais vivamente no coração, sobre o que me parece de uma importância inaudita: ou seja, que aquilo a que se chama Não-resistência não é no fim de contas se não o ensinamento da Lei do Amor, não deformado ainda por interpretações mentirosas. O Amor, ou, noutras palavras, a aspiração das almas à comunhão humana e à solidariedade, representa a lei superior e única da vida... 
E isto, cada um o sabe e sente nas profundezas do seu coração (vemo-lo mais claramente nas crianças). Ele sabe-o enquanto ele não estiver entortilhado na massa de mentira do pensamento do mundo.
Esta lei foi promulgada por todos os sábios da humanidade: hindus, chineses, hebreus, gregos e romanos. Ela foi, creio, expressa mais claramente pelo Cristo, que disse em termos simples que esta Lei contém toda a lei e os profetas.»
Que estas magníficas e tão verdadeiras quão poderosas palavras e ensinamentos de Tolstoi nos fecundem e nos inspirem, neste dia do seu aniversário e em que as ligações entre nós e ele estão mais fluidas....
Biografia, muito simples:

Leitura do muito valioso Apelo à Juventude razoavelmente comentada em improviso:

                   ******* LUZ e AMOR...TOLSTOI *******

2 comentários:

Margarete disse...

Somente uma alma sensível e generosa dedica seu tempo a lembrar os homens de palavras realmente inspiradoras ditas a tanto tempo e tão atuais. Vou retomar a leitura do livro: O que é arte? de Tolstoi. Com gratidão, Maga

Pedro Teixeira da Mota. disse...

Muitas graças, Maga, pela sua sintonia. Boas inspirações toltoianas e plenas!